Processo de Contaminação Microbiana no Post Mortem

Processo de contaminação microbiana de carnes no post mortem
Processo de contaminação microbiana de carnes no post mortem

Veterinária

29/10/2012

Processo de contaminação microbiana de carnes no post mortem A contaminação microbiana inicial da carne, quando ocorre, dá-se primeiramente no processo de abate, que influencia diretamente em sua qualidade geral. Porém, quando métodos adequados são utilizados para sua conservação, como, por exemplo, o resfriamento rápido e imediato, a carga de microrganismos final é reduzida. Este método tem como objetivo primordial diminuir a temperatura da carcaça em um menor tempo possível e reduzir a multiplicação de bactérias deteriorantes e patogênicas.

Através da circulação de ar frio, as bactérias superficiais acabam sendo inibidas, e a ocorrência da dessecação reduz a multiplicação de psicrotróficos (TAURO, KAPOOR e YADAV, 1986; PORTO, 2006; ROÇA, 2009). Durante a etapa de sangria, cerca de 40-60% do volume total de sangue é eliminado, uma parcela permanece retida nas vísceras e de 3 a 5% pode ser encontrada nos músculos. No caso de ovinos, aproximadamente 2 litros de sangue pode ser obtido ao final do processo que dura em média 5 minutos (WILSON, 2005). Nesta fase, o uso de equipamentos mal higienizados, mais especificamente a "faca de sangria", para a secção dos grandes vasos do pescoço pode promover a introdução de microrganismos no sistema vascular.

Como o sangue ainda continua circulando por um certo período de tempo, ocorrerá a disseminação microbiológica por todo o organismo do animal, inclusive no interior de grandes massas musculares devido às condições anaeróbias encontradas. A partir disso, toda a carcaça pode ser comprometida e a deterioração se intensificará através de processos microbianos, físicos e químicos (CANHOS e DIAS, 1983; JAY, LOESSNER e GOLDEN, 2005; PORTO, 2006). A superfície externa do animal, trato digestivo, cavidades nasofaríngeas e a porção final do trato urogenital de animais sadios são consideradas áreas de grande potencial de contaminação. Já o sangue, a medula óssea e os órgãos das cavidades torácica e abdominal são tecidos que podem ser considerados estéreis, por possuírem um baixo número de microrganismos, devido à ação de anticorpos que foram desenvolvidos durante toda a vida do animal, que controlaram com eficiência a ação destes agentes. Estes mecanismos de defesa começam a perder a eficiência algum tempo após o abate, podendo existir uma rápida contaminação da carne se esta estiver associada com a inexistência de práticas higiênico sanitárias adequadas (PORTO, 1996; ROÇA, 2009).

A etapa de esfola é considerada uma das fontes mais evidentes de contaminação, pois o couro do animal possui uma flora normal que é formada por Staphylococcus, Micrococcus, Pseudomonas, mofos e leveduras, além de material fecal. Estes microrganismos podem se originar do solo, da água, pasto e/ou das fezes dos próprios animais e podem incluir também bactérias Gram-negativas, como por exemplo, a Moraxella, Acinetobacter e enterobactérias; psicrotróficos e Brochothrix thermosphacta. A remoção do couro vai expor a superfície da carne ao ambiente e isso vai promover sua maior exposição e consequente contaminação, principalmente se ela entrar em contato com os pêlos do animal e/ou se as facas usadas não forem constantemente esterilizadas.

Além disto, a carcaça vai permanecer exposta principalmente à ação de micrococos, coliformes, bacilos, estafilococos e, E. coli e Pseudomonas, que estão presentes em todas as etapas de manipulação (PORTO, 2006; ROÇA, 2009). O trato gastrintestinal (TGI) apresenta também uma importante fonte de contaminação, sendo que a etapa de evisceração deve sempre ser realizada com muito cuidado para evitar a ocorrência de perfurações durante o manuseio e com isso, minimizar ao máximo a ocorrência de contaminações na carcaça, já que muitos patógenos são geralmente encontrados neste local. O abdome ou o rúmen são regiões bastante importantes neste caso, pois possuem normalmente cerca de 1010 bactérias/g. Inúmeros patógenos podem estar presentes no intestino do animal, tais como Salmonella, C. jejuni, C. perfringens e E. coli enterohemorrágica.

O gênero Salmonella necessita de uma atenção especial, pois é um dos microrganismos relacionados diretamente com a ocorrência de toxinfecções alimentares. Sua presença depende principalmente da alimentação dos animais e das condições de transporte, que acaba intensificando o contato com material fecal. Por isto, é importante a esterilização das facas após o contato com o conteúdo intestinal e em algumas espécies, a oclusão do reto já reduz bastante o risco de contaminação.

Além do TGI, deve-se ter uma grande atenção em relação aos nódulos linfáticos, pois possuem um alto nível de microrganismos, principalmente bactérias, e como permanecem entre as gorduras, podem ser facilmente cortados, promovendo uma contaminação considerável (EDWARDS, JOHNSTON e MEAD, 1997; JAY, LOESSNER e GOLDEN, 2005; PORTO, 2006; ROÇA, 2009). A inspeção sanitária das carcaças e vísceras é voltada especificamente para a detecção de alterações microbianas visíveis, sendo que muitas vezes as manifestações infecciosas não podem ser visualizadas, principalmente quando os animais são portadores assintomáticos e, portanto, reservatórios naturais de certos patógenos.

Neste contexto é muito importante a adoção de medidas preventivas pelos produtores durante toda a cadeia produtiva e a adoção de boas práticas durante as etapas posteriores e o processamento industrial, pelas quais as carcaças e a carne são submetidas. A sanitização das instalações e equipamentos que serão utilizados, além da manipulação adequada são de extrema importância, pois visam a redução da disseminação e proliferação da maior parte dos microrganismos e contaminantes, garantindo desta maneira uma maior qualidade microbiológica ao produto final (LEITÃO, 2003). Inúmeros métodos estão sendo cada vez mais utilizados com o intuito de aumentar o tempo de vida de prateleira do alimento, embora controlem com maior eficiência o processo de deterioração em detrimento aos problemas sanitários.

Desta maneira, diversos países implantam medidas para a descontaminação inicial das carcaças com o intuito de promover a redução microbiológica do produto final. A adoção do programa de Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle (APPCC) e um maior controle nos Pontos Críticos de Controle (PCC) podem ser aplicados em todas as etapas de produção, sendo determinada a probabilidade de ocorrência dos perigos específicos e as medidas preventivas para o seu controle, resultando na diminuição de qualquer risco e garantindo desta maneira, uma maior segurança alimentar (LEITÃO, 2003; RHOADES, DUFFY E KOUTSOUMANIS, 2009). O sistema APPCC consiste na identificação antecipada e avaliação de riscos que possam comprometer a saúde pública, incluindo aspectos microbiológicos, químicos e físicos, tendo como principal objetivo, assegurar a inocuidade e higiene. Neste sistema deve-se definir os limites dos PCCs, que provavelmente podem ocorrer, sendo que para a produção de carnes, os procedimentos mais relevantes estão relacionados à inspeção sanitária ante e post mortem (GIL, 2000).

Referências Bibliográficas GIL, J.I. Manual de Inspecção Sanitária de Carnes. v. I. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2000. 485p. PORTO, E. Microbiologia de carnes. In: CASTILLO, C. J. C. Qualidade da carne. São Paulo: Varela, 2006. Cap.6, p.101-131. ROÇA, R. O. Microbiologia da carne. Disponível em: . Acesso em: 23 Fev. 2009. CANHOS, D. A. L.; DIAS, E. L. Tecnologia de Carne Bovina e Produtos Derivados. São Paulo: Secretaria da Indústria, Comércio, Ciência e Tecnologia, 1983. p. 95-114; 119-126. JAY, J. M.; LOESSNER, M. J.; GOLDEN, D. A. Modern food microbiology. 7 ed. New York: Springer Science, 2005, 790p. TAURO, P.; KAPOOR, K.K.; YADAV, K.S. An introduction to microbiology. New Delhi: New Age International, 1986. 412p. WILSON, A. Wilson's practical meat inspection. 7.ed. Oxford: Wiley-Blackwell, 2005. 306 p. EDWARDS, D. S.; JOHNSTON, A.M.; MEAD, G.C. Meat inspection: an overview of present practices and future trends. The Veterinary Journal, v.154, p.135-147, 1997. LEITÃO, M. F. F. Aspectos microbiológicos das carnes. In: CONTRERAS, C. J. et al. Higiene e sanitização na indústria de carnes e derivados. São Paulo: Varela, 2003. Cap.1. p.1-5. RHOADES, J.R.; DUFFY, G.; KOUTSOUMANIS, K. Prevalence and concentration of verocytotoxigenic Escherichia coli, Salmonella enterica and Listeria monocytogenes in the beef production chain: A review. Food Microbiology, v.26, p.357-376, 2009.

Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.


Rafaella de Paula Paseto Fernandes

por Rafaella de Paula Paseto Fernandes

Médica Veterinária, Mestre em Ciências da Engenharia de Alimentos na Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos da USP e atualmente Doutoranda na mesma área de concentração e instituição.

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