A angústia numa compreensão fenomenológica-existencial

A vivência da angústia pode ser um elemento poderoso para o crescimento e à busca do
A vivência da angústia pode ser um elemento poderoso para o crescimento e à busca do

Psicologia

08/01/2016

angústia pode ser definida como um fator dominante na vida do ser humano e é dito que a mesma pode ser mais poderosa que fome e o amor.

          Desde a infância a criança vivencia este sentimento, ora em maior ora em menor medida, chamada assim de angustia interna instintiva (BOSS, 1981), sendo, portanto, ontogênica ao próprio existir humano, podendo manifestar até mesmo nos sonhos, de forma reiterada.

Em decorrência da fragilidade infantil, uma criança não é capaz de aceitar e carregar este afeto, por isso sonhando, ela teme a desordem de tal força e vivência experiências que fazem parte de sua natural existência. Boss (1981) ainda comenta que nos adultos a demonstração do medo excessivo ocasionado pela angústia pode se mostrar na forma de patologias.

          De acordo com Procópio (2000) a angústia é dificilmente vivenciada de forma plena, embora faça parte da constituição humana. Segundo a autora o ser-aí no cotidiano fica absorvido no mundo, esquecendo de si-mesmo, termo denominado por Heidegger (1988) como de-cadência, em que o ser-aí foge de si-mesmo, caindo e emergindo no mundo, fugindo daquilo que ele realmente quer. Ao tentar afastar-se da angústia, que é inerente ao ser-no-mundo, diminui o peso de sua existência, ou seja, não assume a responsabilidade de ser si-mesmo e acaba por misturar-se com o outro.

angústia dos seres humanos também se manifesta nos quadros patológicos notáveis que a nossa ciência chama de fobias. Isto reafirma o que diz Boss (1981) ao mencionar que o tédio que reina na existência dos atuais neuróticos, com frequência, encobre seu próprio sentido de vida utilizando-se do ruído dominante das atividades ininterruptas, diurnas e noturnas, ou do embotamento das mais diversas drogas e tranquilizantes.

Para Werle (2003) a angústia humana tem um de que, do qual ela tem medo e um pelo que, pelo qual ela teme.  Neste sentido, o de que de cada angústia se refere sempre a uma agressão ao estar-aí (dasein). Em essência este sentimento teme por sua extinção, ou seja, a possibilidade de um dia não estar mais aqui. Já a noção do pelo que da angústia humana é o próprio estar-aí, na medida em que ela sempre se preocupa e zela só pela duração deste.

Diante de tal pressuposto, Santos (2011) afirma que as pessoas que mais temem a morte são aquelas que têm medo da vida, pois é o viver que desgasta e põe em perigo e risco o estar-aí.

          A morte é uma verdade e certeza absoluta, o que pode levar o ser humano durante toda a vida, em ter medo de sua morte, ou seja, temer o seu não-poder-mais-ser. Ao afirmar esta realidade, pode-se considerar que a angústia é inerente a vida, sendo uma parte do nosso estar-aí do qual não é possível se libertar. (POMPEIA; SAPIENZA, 2004).

A dominação do sentimento de angústia se exibe da forma mais clara possível nas pessoas psiquicamente doentes, manifestando-se na atualidade por meio de neuroses psíquicas, problemas psicossomáticos e no vazio existencial representado hoje no mundo e nas pessoas (PROCÓPIO, 2000; WERLE, 2003).

Dentre as possibilidades de afeto, as angústias reais se verificam quando uma criança começa a temer os objetos com as quais ela teve experiências desagradáveis, podendo ser também temidas por adultos, como por exemplo um leão solto, um criminoso, um incêndio, acidente dentre outras situações.

De acordo com Heidegger (1988) a angústia ajuda a definir a essência humana, enquanto vista como uma disposição compreensiva que oferece o solo fenomenológico-hermenêutico para a apreensão explícita da totalidade originária do dasein.

Nesse aspecto, podemos entender então que a angústia não é um simples fenômeno psicológico e ôntico, isto é, que se refere somente a um ente ou a algo dado, e sim seria ontológica, em que se remete à totalidade da existência do homem como ser-no-mundo (NICOLAU, 2007).

Como destaca Boss (1981) toda angústia é fundamentalmente um medo da morte, do não-poder-mais-estar-aqui e a limitação do ser humano. Porém, o autor fala também na existência de um contra-poder à angústia, que se manifesta nos fenômenos do amor, da confiança e do estar-abrigado.

Para enfrentar a situação de angústia exige-se coragem, e num lugar onde não há angústia a ser superada, não seria preciso esta força de proteção. Assim, mesmo na presença do sentimento de angústia, pode-se enfrentá-la por meio das relações amorosas, do estar-abrigado e da confiança, podendo fazer com que o sujeito encontre-se cada vez mais, com sua própria essência e perceba-se como ser-aí diante de inúmeras possibilidades de felicidade e de plena alegria.

Para finalizar é preciso perceber que a angústia também possuía capacidade de trazer abertura ao ser-aí, como enfatiza Figueiredo (2011), uma vez que muitas vezes quando o homem encontra-se no estado de de-cadência, este se perde de si-mesmo e fica perdido no mundo sem referencial ou responsabilidade por sua própria existência, diante deste quadro, a angústia pode promover esta possibilidade de movimento, de vida, de libertação do mundo, afinal o ser-aí que se angustia, o faz por uma razão que exige adaptação e mudança da situação atual de vida, ou seja, que o  ser humano encontre-se novamente consigo mesmo e permita a expressão verdadeira de sua essência.

Desta maneira, a angústia como elemento ontogênico da existência do ser humano, não apenas causa certo temor, mas também é capaz de abrir portas e possibilidades para gerir crescimento pessoal e uma maior apropriação do indivíduo com sua própria essência.

 

Referências

 

BOSS, M. Angústia, culpa e libertação. 3ª Ed. São Paulo: Duas cidades, 1981.

 

FIGUEIREDO, K. F. A angústia enquanto abertura fundamental da presença (ser-aí) em "Ser e Tempo". 27f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Filosofia). Campo Grande, Universidade Estadual da Paraíba, 2011. Disponível em: <http://dspace.bc.uepb.edu.br:8080/jspui/handle/123456789/2044>. Acesso em: 18 nov. 2013.

 

HEIDEGGER, Martin. Ser e tempo. Petrópolis: Vozes, 1988.

 

NICOLAU, Álvaro Antônio. Ser-no-mundo na contemporaneidade. 69f. Monografia (Graduação em Psicologia). Centro Universitário Newton Paiva, Belo Horizonte, 2007. Disponível em: < http://www.fgr.org.br/admin/artigos/2008354118018712411075651667SER-NO-MUNDO_NA_CONTEMPORANEIDADE.pdf>. Acesso em: 17 nov. 2013.

 

POMPEIA, J. A.; SAPIENZA, B. T. Na presença do sentido: uma aproximação fenomenológica a questões existenciais básicas. São Paulo: Paulus, 2004.

 

PROCÓPIO, D. A crise: como possibilidade de crescimento pessoal. Lorena: Stiliano, 2000.

 

SANTOS, Pedro Carlos Ferreira. A atualidade do conceito de angústia de Kierkegaard. Revista da Universidade Vale do Rio Verde, v. 9, n. 2, p. 202-214, 2011. Disponível em: < Disponível em: <http://dx. doi. org/10.5892/ruvrv.2011.92.202214>.

 

WERLE, M. A. A angústia, o nada e a morte em Heidegger. Trans/Form/Acao, São Paulo, v.26, n.1, 2003. Disponível em: <http://www2.marilia.unesp.br/revistas/index.php/transformacao/article/view/848>. Acesso em: 15 nov. 2013.

Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.


Thiago Ribeiro Borges

por Thiago Ribeiro Borges

Especialista em Docência no Ensino Superior e em Psicologia Analítica. Graduado e licenciado em Psicologia pelo UNISAL. Pesquisador dos Grupos de Pesquisa Desempenho Acadêmico e Metodologias Aplicadas e Desenvolvimento Humano e Saúde Mental. É professor de psicologia em cursos técnicos, psicólogo clínico e orientador educacional (Tutor EAD) no Centro Universitário Internacional.

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