Inconsciente e suas armadilhas

Consultório Psicológico Rosangela Brunet
Consultório Psicológico Rosangela Brunet

Psicologia

23/02/2015

O inconsciente é um fio condutor das construções psíquicas e sociais , as quais dão ao seu criador a capacidade de gerar teorias, constructos científicos; criar organizações, formas de gerenciamento; formar culturas organizacionais; construir leis e filosofias. Isso acontece como uma espécie de respostas a partir de demandas, inquietações inconsciente, angústias e medos. É necessário uma constante reflexão sobre o que temos construído ao longo de nossa vida, seja a vida pessoal ou organizacional. Michel Foucault disse uma vez: "Existem momentos na vida onde a questão de saber se se pode pensar diferentemente do que se pensa, e perceber diferentemente do que se vê, é indispensável para continuar a olhar ou a refletir".

Na medida em que entramos em contato com este universo inconsciente, abrimos as portas para sermos salvos destas construções que nos aprisionam. O indivíduo tem a tendência de construir armadilhas inconscientes das quais não tem mais facilidade de sair, pois se torna difícil de as enxergar como tal. Essas armadilhas têm como base suas inquietações, medos, angústias e desejos inconscientes. São fenômenos psíquicos que ocorrem em função de processos conscientes ou inconscientes, os quais podem gerar pensamentos, ideias, raciocínios, teorias e até mesmo organizações sociais, bem como formas de gerenciá-las.

Por ser vinculada a dimensões inconscientes, se tornam armadilhas que exercem controle sobre seu criador, e o impossibilita de provocar qualquer transformação passível de legítima intervenção sobre sua própria “obra”.

Carl Gustav Jung disse "[...] às vezes somos tomados por estados e emoções que despertam em nós impulsos, sentimentos, pensamentos e imagens que nos parecem totalmente estranhos. Frequentemente, tais emoções são diametralmente opostas aos nossos pontos de vista ou intenções, de tal forma que dão a impressão de se tratar de manifestações de um ser com existência própria, diferente de nós.”.

Se algo não foi exposto à luz do "conhecimento", e isso precisa acontecer no processo de autoconhecimento, estaremos fadados a estas armadilhas. Veja o que Erich Fromm disse: "o maior desafio do homem é dar à luz a si mesmo, é tornar-se aquilo que ele é potencialmente".
Um caso exemplar é o de Frederick Fayol, o pai da administração, cuja personalidade era obsessiva compulsiva, o qual foi responsável por revolucionar a forma de gerenciar empresas e pessoas com sua teoria sobre controle. Outro caso bem conhecido é o próprio Freud que possuía angústias e questões relacionada com a sexualidade, e influenciado com uma cultura extremamente rigorosa em termos de regras e dogmas, ele conseguiu ser o pai da Psicologia. Em ambos os casos estas teorias se tornaram, em minha opinião, uma construção psíquica digna de ser repensada. No caso de Fayol isso já tem sido feito, pois a realidade empresarial difere da psicologia, pois ela exige um imediatismo em função da necessidade de lucro e produtividade, então o que não funciona tem que ser revisto. No caso da psicologia, outras teorias oferecem pressupostos diferentes. Se as teorias não são repensadas e a ciência não avança quem paga o ônus, no caso da Psicologia e medicina, é o paciente. É necessário então, uma constante revisão teórica em função das mudanças de paradigmas.

”A metáfora de uma prisão psíquica pode dramatizar em excesso a maneira pela qual é possível cair em armadilha geradas por formas assumidas de raciocínios.”(Gareth Morgan, pag165)

Carl Gustav Jung também reforça esta ideia quando diz: "Dentro de cada um há uma sombra escondida. Por trás da máscara que usamos para os outros, por baixo do rosto que mostramos a nós mesmos, vive um aspecto oculto da nossa personalidade. De noite, enquanto dormimos indefesos, essa imagem nos confronta face a face.”.

"A Caverna de Platão”, citada na república de Platão como um exemplo clássico de Prisão Psíquica.

Assim como os terapeutas não podem ir além de suas resistências, e para isso é necessário uma constante supervisão, as teorias também necessitam de reformulação. Como na caverna de Platão, muitas vezes pode-se estar vendo as sombras sem que saibamos que elas não condizem com a verdade. é necessário, então sair da caverna para e se expor a luz (Verdade do conhecimento), então entender que algumas vezes o que consideramos verdade são apenas sombras, aparência do que seria a realidade. É necessário uma constante reflexão de nossas crenças e pensamentos, pois ao longo da vida o indivíduo vai construindo formas de pensar, modos de vida, raciocínios , teorias e visão de mundo que podem ter sido gerados por defesas para lidar com suas angústias e medos. e essas construções podem se tornar armadilhas das quais o sujeito não consegue enxergar.

Allisson Vasconcelo Oliveira e Isabelle Fernandes Vieira de Matos Rocha explica algo muito interessante sobre essas controvérsias existente no processo de crescimento pessoal e autoconhecimento. " A política da sociedade busca encaixar as pessoas em categorias convenientes a ela, sendo bonito, feio, gordo, magro, nerd, popular, louco, inteligente ,burro, etc são alguns deles. Por mais fácil que seja viver sobre um rótulo, como são apenas máscaras que escondem o verdadeiro eu, serão quebrados. A compreensão sobre si mesmo e a busca de agradar a si e não a sociedade se mostra como o melhor método de superar esse desafio social.". Com essa colocação podemos entender a urgência de Friedrich Nietzsche (1844-1900), filósofo alemão ,quando disse : "Torna-te quem tu és". Edward Estlin Cummings, disse em um de seus escritos :" É preciso ter coragem para crescer e tornar-se o que você realmente é”

Que ver a seriedade do comprometimento de nosso julgamento e ação no mundo? Veja esta foto abaixo; O que você vê?

O que você esta vendo. Uma mulher velha ou uma jovem?
A Percepção da "realidade" esta ligada diretamente a subjetividade, a experiência de cada um. O que se vê é o que se pode enxergar no momento. O que se percebe é o que se elegeu como "mais importante" no aqui e no agora. Isso acontece porque o "Todo não é a soma das partes". Segundo Ana Lucia Santana" ...não se pode conhecer o todo através das partes, e sim as partes por meio do conjunto. Este tem suas próprias leis, que coordenam seus elementos. Só assim o cérebro percebe, interpreta e incorpora uma imagem ou uma ideia." Friedrich Nietzsche (1844-1900) ainda acrescentaria dizendo "Não há fatos, só interpretações". Algumas vezes o processo de autodescoberta precisa passar pela psicoterapia, pois o sujeito não esta preparado para fazê-lo por si só. Veja uma colocação de Vera Felicidade ,onde ela esclarece a necessidade deste processo, bem como sua importância:

"Em psicoterapia, quando as máscaras, os disfarces da não aceitação são denunciados, o indivíduo se sente ameaçado. Arrancar a máscara é vivenciado como arrancar a própria pele. Ele resiste, desiste, até que percebe que não arrancar a máscara é imobilizar-se e desistir de viver. Este impasse entre querer continuar no processo da não aceitação e sentir-se imobilizado por ele, esta percepção das implicações, é o que possibilita a continuidade. Os pontos começam a ter sequência, o movimento começa a se estabelecer. É a mudança, é o movimento, é a transcendência dos limites até então responsáveis por medos (omissão), submissão, raiva. O processo de aceitar que não se aceita se inicia. Esta aceitação é fundamental para quebrar os posicionamentos, para mudar o autorreferenciamento, para recontextualizar os impasses e conflitos."
Porém, é claro que, como disse (Whitmont, p.140):

"Em sociedade, é importante desenvolvermos nossas personas assim como um ego adequado para que possamos nos relacionar com o coletivo. Devemos ter em mente, a necessidade dessa exigência, não deixando de lado, porém, aquilo que realmente somos." Temos de descobrir que usamos nossas vestimentas representacionais para proteção e aparência, mas que também podemos nos trocar e vestir algo mais confortável quando é apropriado, e que podemos ficar nus em outros momentos. Se as nossas vestes grudam em nós ou parecem substituir a nossa pele é bem provável que nos tornemos doentes.

O importante é estar consciente de que estamos num processo de construção do conhecimento, e que, se a visão ainda é parcial, teremos a tendência a enxergar com parcialidade; e dai a necessidade de uma constante busca por explicações e respostas. Por isso, considero fundamental uma revisão sistemática das nossas teorias e construções psíquicas. O Carl Sagan disse uma vez nos ajuda a elucidar essa reflexão:
 
"Descobrir a gota ocasional de verdade no meio de um grande oceano de confusão e mistificação requer vigilância, dedicação e coragem. Mas, se não praticarmos esses hábitos rigorosos de pensar, não podemos ter a esperança de solucionar os problemas verdadeiramente sérios com que nos defrontamos - e nos arriscamos a nos tornar uma nação de patetas, um mundo de patetas, prontos para sermos passados para trás pelo primeiro charlatão que cruzar o nosso caminho".

No âmbito pessoal, como construção psíquica, os pensamentos e raciocínios que construímos podem limitar nossa forma de ver o mundo, bem como dirigir nossa forma de lidar com o meio. Porém, Carl Rogers disse uma vez: "(...) o ser humano tem a capacidade manifesta ou latente de compreender-se a si mesmo, e resolver seus problemas de modo suficiente para alcançar a satisfação e eficácia necessária ao funcionamento adequado”. Carl Rogers era da linha fenomenológica, diferente de Freud. Levando as diferentes crenças teóricas, pode-se entender a razão das diferente experiências em suas vivências no exemplo que descreverei abaixo.

A relação de Sigmund Freud com seus mestres pode servir de um bom exemplo desse tipo de raciocínio ou pensamento limitador. Freud transitava entre o apego apaixonado por esses mestres e sua necessidade de superação. Ele iniciou essa jornada com Erneste Brucke, passando por Meynert, Charcot, Joseph Breuer e finalmente wilhelm Fliess, o qual o ajudou juntamente com Sartre a desfrutar e entender sua capacidade de ser seu próprio mestre, criador de seu próprio pensamento e autor de sua própria história. Isso me reportou ao fato de que precisamos nos desligar de nossos "mestres " internos para nos tornar geradores de nossa própria criação. No final, com a ajuda de Fliess, Freud assume, aliviado de culpa, e inicia seu movimento de libertação dando lua ás suas ideias com mais autonomia ,e aceitando sua superioridade sobre “aquele que o fez”, e ,deste processo desabrochou um gênio, que do mesmo modo que um arqueólogo, desvendava misteriosamente a mente humana como ninguém. Rosângela Brunet

“As certezas são as maiores ilusões criadas pela mente humana. Contentamo-nos com a certeza quando nos vimos incapazes de continuar a questionar e não porque estamos realmente certos.” Renato Dias Martino.


Referência Bibliográfica


[1]MORGAN, Gareth. Psicodinâmica da Vida Organizacional - Motivação e Liderança

[2] KUPFER, Maria Cristina ." FREUD E A EDUCAÇÃO- O Mestre do Impossível."

[3] Carl Gustav Jung, In Emma, Animus e Anima

[4] Carl Sagan- O ceticismo necessário

[5]Rogers,Carl -Tornar-se pessoa 1981, p .33

[6](Whitmont, p.140, In BOLETIM CLÍNICO - número 20- julho/2005 - PUC-SP)

Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.


Rosângela Siqueira Brunet

por Rosângela Siqueira Brunet

Curso Superior em Psicologia Formação Clínica em Gestalt terapia Pós-graduação em Educação Corporativa Pós-graduação em Arteterapia Certificado Internacional em Coachig e Holomentoring

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