Transtorno de estresse pós-traumático

Sentimentos de estar revivendo a situação indefinida
Sentimentos de estar revivendo a situação indefinida

Psicologia

20/02/2013

Embora os sintomas presentes no transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) já tenham sido descritos há cerca de 100 anos, embora ainda não apresentasse essa denominação nessa época, foi somente após a Guerra do Vietnã que foi dada maior atenção a esse transtorno. Ao regressarem aos Estados Unidos após servirem nessa guerra, os soldados passaram a manifestar sintomas de trauma psicológico pronunciado, com significativo prejuízo de sua vida pessoal, e os médicos passaram a se interessar por esta condição.

Em 1980, o transtorno passou a compor, oficialmente, o quadro dos subtipos de transtornos de ansiedade apresentados pela terceira edição do DSM. A partir daí, muitos estudos psicológicos, farmacológicos e neurológicos foram sendo desenvolvidos em ordem de se conhecer melhor o TEPT.

O TEPT é um transtorno caracterizado por sintomas que surgem após a exposição do indivíduo a um evento traumático grave. Esses sintomas incluem:

-Sentimentos de estar revivendo a situação indefinidas vezes;

-Comportamento de evitação a situações ou estímulos que lembrem a situação traumática;

- hiperexcitabilidade associada a essas condições;

- Embotamento afetivo;

- Intenso e constante medo, horror e sentimento de impotência;

- Diminuição do interesse geral em relação às pessoas ou situações;

- Sintomas persistentes de ansiedade que não estavam presentes antes do trauma.

Para o diagnóstico do TEPT, esses sintomas devem ocorrer em conjunto e persistir por no mínimo três meses. Muitas vezes, ocorre uma latência entre a ocorrência do evento traumático e o aparecimento dos sintomas. O indivíduo sente-se como se estivesse revivendo o evento traumático indefinidamente, o que é vulgarmente chamado de flashback. Neste momento, as sensações psíquicas e físicas experimentadas são exatamente as mesmas que se teve no momento exato do trauma psicológico. Geralmente, a pessoa tende a evitar ativamente situações e conversas associadas ao evento e, adicionalmente, desenvolve um medo extremo, verdadeiro pavor, de que venha a ocorrer novamente, consigo ou com outros.

Em conjunto, essas sensações acabam por diminuir significativamente seu interesse em atividades rotineiras, perde a vontade de interagir com outras pessoas ou de participar de eventos sociais. Afastando-se dos amigos e até mesmo da família, e criando um isolamento que tende a agravar não só seus sentimentos negativos com relação ao trauma; como cria novos sentimentos negativos, relacionados à solidão provocada pelo evento traumático. Além dos sintomas comportamentais mencionados, sintomas físicos também são manifestados, principalmente os associados a uma hiperativação autonômica, com profundas alterações do sono, dificuldade de concentração, presença constante de palpitações, sudorese ou tremores, hipervigilância e reações exageradamente intensas de sobressalto a qualquer estímulo.

Apenas a título de exemplo, abaixo está descrito um depoimento verídico de um paciente atendido pelo Ambulatório de Ansiedade, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, para exemplificar o sofrimento experimentado por quem sofre de TEPT:

“Aquele dia poderia ter sido apenas mais um, mas na realidade ele mudou completamente minha vida. Estava com meu pai em um pequeno supermercado perto de casa e,  quase já saíamos, quando apareceram dois indivíduos encapuzados. Foi tudo muito rápido. Apontaram suas armas para nós, que  estávamos no caixa, e deram uma coronhada no dono do mercadinho para intimidá-lo. Meu pai, por puro reflexo, tentou ampará-lo e acabou levando dois tiros. Enquanto ele estava caído, sangrando muito, um dos ladrões mantinha sua arma em minha cabeça e o outro roubava. 

Fui levado como refém, sofrendo ameaças de morte constantes. Após rodar duas horas pela cidade e ter que sacar dinheiro em caixas eletrônicos, fui abandonado numa avenida muito longe do local onde eu estava anteriormente. Quando cheguei ao hospital meu pai já estava morto. Já faz três meses e não consigo esquecer, tenho pesadelos diários com o ocorrido ,não entro mais em supermercados, não tenho vontade de sair com meus amigos, falar a respeito de tudo aquilo me faz muito mal, começo a suar e tremer. Ultimamente, não tenho conseguido dormir direito. Passei a andar armado, tenho tido algumas visões, parecem pedaços de um filme que passam em minha mente, flashes do ocorrido. Desconfio de todos, tenho até medo de atirar em alguém suspeito”.

Um dado importante a ser mencionado é que o TEPT pode ser desenvolvido não somente pela pessoa que vivenciou diretamente o evento traumático. Indivíduos que tenham testemunhado um evento traumático ocorrido com terceiros, ou pessoas que tenham apenas tomado conhecimento da ocorrência de um evento traumático, também podem vir a desenvolver o TEPT. No caso de eventos ocorridos diretamente à pessoa, as situações traumáticas mais frequentemente associadas ao desenvolvimento do TEPT são: assaltos; vivência de guerras; ser vítima de atos terroristas; de sequestro; torturas ou violência sexual; acidentes automobilísticos graves; receber notícia de estado grave de saúde; violência infantil; entre outros.

Entre os estímulos eliciadores de TEPT em pessoas que tenham testemunhado o evento estão: presenciar um assassinato ou violência extrema; encontrar corpos humanos; presenciar evento traumático ocorrido com parente ou amigo íntimo. Já entre as situações que podem vir a desencadear o TEPT em pessoas que apenas tomaram conhecimento de uma situação traumática estão: saber da ocorrência de um ataque violento; sério acidente ou ferimentos graves sofridos por um membro da família ou ente querido; saber da morte súbita ou inesperada de um membro da família ou ente querido; saber da ocorrência de doença com risco de vida a filhos ou pais; entre outros.

Um fator interessante é o fato de que nem todas as pessoas que vivenciaram um evento traumático acabam por desenvolver o TEPT, e essa é uma questão que tem intrigado os pesquisadores. Segundo algumas pesquisas, apenas 15 a 30% dos indivíduos que vivenciam situações traumáticas acabam desenvolvendo o TEPT. Embora ainda não se saiba exatamente o motivo disso, acredita-se que existam alguns fatores predisponentes ao desenvolvimento deste transtorno. Acredita-se que o sexo feminino apresenta maior predisposição ao TEPT, uma vez que o transtorno ocorre em uma proporção de 2:1 em relação ao sexo masculino.

Além disso, outros fatores parecem contribuir ao seu aparecimento, tais como: já ter vivenciado outras situações traumáticas; ter uma história pessoal ou familiar de outros transtornos psiquiátricos; ter vivenciado história de separação precoce (seja com relação aos pais e cuidadores, sejam em relação a companheiros afetivos); ter vivenciado situações traumáticas na infância; entre outros fatores. Além disso, parecem existir alguns fatores específicos os quais dispõe o indivíduo a uma maior vulnerabilidade ou tolerância à ocorrência do TEPT, como fatores que precedem o trauma (variações genéticas); fatores concomitantes ao trauma (severidade e duração); e fatores que estão presentes após o trauma (apoio social e compreensão familiar).

Diferentes estudos comprovam a existência de elevadas taxas de comorbidade nas pessoas com TEPT. Indivíduos com TEPT têm duas a quatro vezes maior probabilidade de apresentar outro transtorno psiquiátrico, em relação às pessoas sem TEPT, e os mais frequentemente observados são depressão severa, transtorno de abuso de substâncias e transtornos de personalidade. Além disso, é importante ressaltar que as pessoas com TEPT tendem a tentar o suicídio seis vezes mais do que outras pessoas, sendo o transtorno de ansiedade com a maior relação com tendências suicidas, daí sua elevada importância em termos de tratamento, apoio e acompanhamento.

Outro aspecto importante em relação à vida produtiva dos indivíduos com TEPT se refere ao comprometimento no trabalho, o qual é similar ao prejuízo associado às pessoas com depressão, mas menor que o comprometimento dos indivíduos com transtorno do pânico. Esse comprometimento refere-se tanto à alta porcentagem de ausências quanto ao fato de que pacientes com TEPT tendem a se submeter a atividades profissionais que lhes pagam salários inferiores, em função do fato de se julgarem incapazes de lidar com o estresse provocado por um trabalho que lhes remunere melhor.

Com relação ao tipo de tratamento deste transtorno, as abordagens psicoterapêuticas e farmacológicas são de fundamental importância, principalmente quando administradas em conjunto. O tratamento psicoterápico facilita à adesão ao tratamento farmacológico, bem como evita recidivas, e o tratamento farmacológico permite a melhora dos sintomas, para que o paciente possa se dedicar mais ao tratamento psicoterapêutico. Do ponto de vista farmacológico, diferentes categorias de medicamentos têm sido empregadas no tratamento do TEPT, na dependência da sintomatologia e das características individuais do paciente. Entre essas categorias estão: antidepressivos (como a imipramina, fluoxetina e paroxetina), benzodiazepínicos (como o diazepam) e outras drogas, embora de uso menos comum, como o topiramato e o valproato de sódio.

Do ponto de vista psicoterapêutico, a técnica com maiores níveis de sucesso no tratamento do TEPT tem sido a psicoterapia do tipo cognitivo-comportamental. Neste ponto, é importante ressaltar que um estudo realizado na Universidade de São Paulo. Ele mostrou por meio de investigações com neuroimagem, que a terapia de exposição e reestruturação cognitiva foi capaz de alterar o funcionamento de determinadas estruturas cerebrais (diminuição da atividade da amígdala cerebral e aumento da atividade do córtex pré-frontal) em pacientes com TEPT (vítimas de assalto, acidentes graves ou violência sexual). Isso comprova a importância da abordagem psicoterapêutica no tratamento desses pacientes.

Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.


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