Os jogos pedagógicos na aprendizagem do aluno com deficiência visual

O jogo como recurso educativo
O jogo como recurso educativo

Educação e Pedagogia

17/04/2014

INTRODUÇÃO

Esta pesquisa pretende mostrar a origem dos jogos, da ludicidade na aprendizagem das crianças e a sua importância para o desenvolvimento de crianças com deficiência visual, apresentando jogos e brincadeiras, capazes de ajudá-las na aprendizagem do Sistema Braille e soroban, ferramentas utilizadas por essas pessoas. O braile é o sistema de leitura/escrita com o tato para cegos inventado pelo francês Louis Braille. O sistema é um alfabeto convencional cujos caracteres se indicam por pontos em relevo. A partir de 6 (seis) pontos salientes, é possível fazer 63 (sessenta e três) combinações que podem representar letras simples e acentuadas, pontuações, algarismos, sinais algébricos e notas musicais. Já o soroban ou sorobã, é o nome dado ao ábaco japonês que consiste em um instrumento para cálculo. (WIKIPÉDIA,2009). Pretende-se mostrar, também, para responsáveis e educadores, como os jogos influenciam no desenvolvimento motor e cognitivo dessas crianças.


A motivação de pesquisar sobre esse tema se deu pelo meu cotidiano, pela minha vivência nesta área como Assistente de alunos no Instituto Benjamin Constant, além das observações feitas nas aulas presenciadas no Instituto. O Instituto Benjamim Constant foi fundado no dia 17 de setembro de 1854, especializada no ensino de crianças e jovens com deficiência visual, onde pude ver, na prática, o desenvolvimento delas.


Utilizei como base para esta pesquisa, estudos recentes sobre jogos e brincadeiras específicas para crianças com deficiência visual, entendendo que os jogos são um excelente recurso para que elas possam aprender e tenham a possibilidade de se desenvolver melhor, de assimilar melhor os conteúdos, auxiliando-as na leitura e na escrita e, muitas vezes, ajudando-as, também, nos conteúdos matemáticos.


Crianças, com ou sem deficiência, aprendem melhor quando a ludicidade se faz presente em sala de aula, pois, através de jogos e brincadeiras, a assimilação de conteúdos se faz de uma forma mais simples e prazerosa. O jogo é tido como facilitador do processo educacional, tanto para a estruturação da personalidade como para os processos cognitivos e além de estimularem a inteligência, a atenção e a concentração, estimulam também, o desenvolvimento da linguagem e da socialização.


O presente trabalho faz uma referência à relevância dos jogos pedagógicos na aprendizagem de crianças com deficiência visual na fase da Educação Infantil e no atual 1º ano do Ensino Fundamental, antigo C.A. e está dividido em três momentos. Serão apresentados, inicialmente, a origem dos jogos; em seguida, os conceitos pedagógicos em relação à deficiência visual e, por último, a importância do jogo na aprendizagem, levando em consideração o tipo de deficiência visual de cada aluno para um melhor atendimento.


O primeiro capítulo, portanto, fará um breve levantamento histórico, começando na Idade Antiga com Platão e Sócrates, que já mencionavam a importância das crianças pequenas aprenderem brincando por considerarem que através da brincadeira as crianças estariam fazendo um ensaio para a vida adulta, até chegar aos dias atuais com a autora Mara Siaulys, autora do livro “Brincar para todos”, onde ela mostra, através de exemplos, alguns jogos, brinquedos e brincadeiras específicas para crianças com deficiência visual no período da Educação Infantil. Os jogos apresentados por ela são jogos que ajudam no desenvolvimento e na aprendizagem dessas crianças no que diz respeito à introdução ao Sistema Braille, na apresentação dos conceitos matemáticos e na ajuda em suas atividades da vida diária.


No segundo capítulo, serão apresentadas as classificações e as implicações da deficiência visual de acordo com a Secretaria de Educação Especial, enfatizando a priorização do ensino dessas crianças em classes regulares de ensino, embasada na lei que assegura a entrada e permanência de crianças com deficiência na escola, mostrando, também, a importância das Salas de Recursos para o desenvolvimento das mesmas.


No último capítulo falarei sobre o jogo pedagógico em si e sua importância na vida das crianças com deficiência visual, possibilitando-as experiências para um melhor entendimento com jogos para crianças cegas e jogos para crianças com baixa visão, de acordo com o período escolar em que essas crianças se encontram, dando exemplos de jogos, feitos com materiais alternativos ou não e mostrando como eles podem ser utilizados por professores, pais e responsáveis. Será abordada, ainda, nesse capítulo, a importância de se terem profissionais especializados para atender a esse público e de como esses jogos promovem a integração e a interação dessas crianças na sociedade.


Além da utilização de textos, referências bibliográficas, autores como Piaget, Vygostsky, entre outros, que discutem sobre o tema, o presente estudo leva, ainda, em consideração a observação, o dia a dia dessas crianças dentro e fora da sala de aula do Instituto Benjamin Constant, fazendo uma ponte entre teoria e prática.


CAPÍTULO 1: A ORIGEM DOS JOGOS, DA LUDICIDADE NA APRENDIZAGEM DA CRIANÇA

Os jogos pedagógicos surgiram no século XVI, porém existem estudos que afirmam que eles surgiram na Antiguidade, precisamente em Roma e na Grécia com Platão e Sócrates. (KISHIMOTO, 1998, p.14)


Platão já falava sobre a importância de se aprender através da brincadeira e Aristóteles, com o mesmo pensamento, sugeriu que os jogos fossem usados na educação de crianças pequenas, principalmente jogos que imitassem as atividades dos adultos, preparando-as para a vida adulta, porém, ainda não havia uma discussão mais séria sobre o emprego dos jogos como recurso para o ensino da leitura e do cálculo. (KISHIMOTO, 1998)


O jogo como recurso educativo propriamente dito só veio se tornar destaque com o aparecimento da Companhia de Jesus, fundada por Ignácio de Loyola no século XVI, através de exercícios de caráter lúdico. (KISHIMOTO, 1998, p.15)


No século XVII, os jogos educativos se expandiram, através das ideias humanísticas do Renascimento e, com isso, foram multiplicados, não apenas os jogos de leitura como os referentes às matérias didáticas, respondendo, por sua vez, aos estudos filosóficos a respeito destes assuntos abordados por Comenius e Locke. (KISHIMOTO, 1998)


Com o desenvolvimento do movimento científico do século XVIII os jogos se tornaram populares, mudando assim o olhar da sociedade em relação à criança que passou a ser vista como um ser dotado de natureza distinta do adulto, criando-se, então, lugares próprios à educação da infância. (KISHIMOTO, 1998)


Com o término da Revolução Francesa no século XVIII, surgiram as inovações pedagógicas, reforçando assim, as práticas de Rousseau, Pestalozzi e Froebel, sendo que, com este último, os jogos se tornaram objeto e ação de brincar, caracterizando-se pela liberdade e espontaneidade, fazendo parte da história da Educação Infantil. (KISHIMOTO, 1998, p.16)


Como parte dessa discussão, Maria Montessori, uma médica e educadora italiana, após experiências com crianças excepcionais, desenvolveu, no início do século XX, vários materiais manipulativos destinados à aprendizagem da matemática. Estes materiais, com forte apelo à “percepção visual e tátil”, foram posteriormente estendidos para o ensino de classes normais. Montessori acreditava não haver aprendizagem sem ação, era preciso fazer para aprender. Entre seus materiais mais conhecidos, destacamos, “material dourado”, os “triângulos construtores”, “material de equivalência” e os “cubos para composição e decomposição de binômios, trinômios”.(FIORENTINI e MIORIM, 1990, p.3).


No final do século XX, surgem dois autores que tratam da relevância do tema, Piaget e Vygotsky. Piaget reuniu um modelo para descrever como os seres humanos dão sentido ao seu mundo e como desenvolvem o pensamento. (MARANHÃO, 2007, p.17)


Segundo ele, o brinquedo para a criança é uma forma dela representar a realidade e, particularmente, para a criança com deficiência visual, o jogo tem o papel de estimular essa representação, pois é através das brincadeiras que a criança tem a possibilidade de reproduzir situações vividas na realidade, em seu meio, é através da brincadeira que ela se apropria de conhecimentos que possibilitarão sua ação sobre o meio em que se encontra. (MARANHÃO, 2007, p.18)


Piaget diz que o desenvolvimento da inteligência está voltada para o equilíbrio e a inteligência em si, é a adaptação, isto é, o homem procura sempre atingir o equilíbrio, porém, suas ações têm necessidade de provocar no sujeito um estado de desequilíbrio, forçando-o à necessidade de buscar uma forma de se relacionar com o meio para adaptar-se à ele. (Ibid)


Piaget, em seu estudo, divide o desenvolvimento em fases e em cada uma delas a criança reage de uma forma diferente ao brincar. O primeiro estágio apresentado por ele é o estágio conhecido como sensório-motor, que vai até os dois anos aproximadamente. É nessa fase que a criança brinca e interage com o mundo. O crescimento cognitivo se baseia em experiências sensoriais e ações motoras, os bebês adquirem conhecimentos sobre os objetos através de suas interações com eles e a inteligência se manifesta em ações. A criança pequena aprende pela ação sensório-motora, pela repetição. No estágio Sensório-Motor, o corpo é o primeiro brinquedo que a criança conhece, ela o explora e começa a conhecer os estímulos externos, fazendo com que o seu corpo se adapte ao meio. (MARANHÃO, 2007, p.20)

De acordo com Piaget (1978), a partir de 1 ano e meio em diante, a criança começa a fazer representações internas, simbólicas, dos problemas sensório-motores, começa a inventar soluções através de comportamentos, implícitos de ensaio-e-erro. A criança ultrapassa, então, os limites entre o período sensório-motor e o pensamento pré-operacional. Ainda segundo Piaget (1978), a inteligência está ligada à biologia, e através das estruturas biológicas que se estabelecem o que percebemos diretamente. Em outras palavras, não herdamos estruturas cognitivas, elas são adquiridas no decorrer do desenvolvimento, e sim o que Piaget chama de modus operandi, que é a interação entre o indivíduo e o ambiente. (ARAUJO, 1997, p.2)


O segundo estágio é conhecido como Pré-Operacional que vai dos dois aos sete anos, onde a criança brinca e começa a entender melhor o mundo. Com o início da linguagem, a criança redimensiona seus esquemas, reestruturando os quadros mentais para poder gerar, assim, novos esquemas. É nesse estágio que a criança começa a imitar tudo o que vê e a brincadeira passa a ter um sentido de assimilação do ambiente, passando a reproduzir o seu meio e as brincadeiras de faz-de-conta se tornam essenciais, pois, através delas, a criança a começa e entender o mundo que a cerca. “Nesse estágio de desenvolvimento, a brincadeira assume um caráter importante para a aquisição do código de linguagem e para a organização do pensamento”. Essa capacidade que se tem de se trabalhar com símbolos é chamada de função semiótica. A criança desenvolverá essa função naturalmente através de jogos e de brincadeiras. Por isso, é preciso que o adulto entenda a forma de pensar que a criança possui para que ele possa proporcionar a ela os momentos lúdicos necessários, as brincadeiras específicas que a auxiliarão em seu desenvolvimento. (MARANHÃO, 2007 p.23)


O terceiro estágio é o Operacional-Concreto que vai dos 7 aos 11 anos, e é denominado por Piaget como o estágio do pensamento. É nesse estágio que o corpo ganha espaço na brincadeira através do movimento e a criança tem a criatividade como a sua maior característica. Maranhão (2007) diz que, é nessa fase que as brincadeiras devem ter sempre o objetivo de interação social, já que, é através da interação social que se dá a construção de vínculos e a formação de laços afetivos. É nessa fase que os jogos com regras devem ser inseridos nas brincadeiras, sinalizando para a criança a importância de aprender a respeitar os outros colegas. (MARANHÃO, 2007, p.27)


O quarto e último estágio é o Operacional-Formal, que começa aos 11 anos de idade. Nesse estágio a criança já consegue analisar as situações antes de agir, e suas ações já podem ser classificadas, organizadas. Como nessa fase a criança entra na puberdade, na adolescência, os jogos se tornam um atrativo ainda maior e é nessa fase que o jovem quer transformar a realidade, achando que pode mudar o mundo.


Ele dividiu os jogos em três tipos: jogos de exercício, simbólicos e de regras, além de jogos de construção, presentes ao longo do desenvolvimento. Nos jogos de exercício, a única finalidade é o próprio prazer do funcionamento. Dividem-se em sensório-motores e de exercício do pensamento. Esses tipos de jogos são bem encaixados no primeiro estágio apresentado por ele, o Estágio Sensório-Motor. Já os jogos simbólicos têm como função a compensação, realização de desejos e liquidação de conflitos, e são expressos através do faz-de-conta e da ficção. São característicos da fase que vai do aparecimento da linguagem até aproximadamente seis, sete anos, portanto, esses jogos são ótimos para as crianças que se encontram no Estágio conhecido como Pré-Operacional. Os jogos de regras são aqueles no qual a regularidade é imposta pelo grupo, resultado da organização coletiva das atividades lúdicas. As regras podem ser transmitidas ou espontâneas e passam de uma condição inicial motora e individual, depois egocêntrica, de cooperação até a codificação. Assim, como já foi dito, esses jogos devem ser introduzidos quando as crianças estiverem no Estágio Operacional-Concreto.


Outro autor que também estudou o desenvolvimento da criança foi Vygotsky. Vygotsky evidencia a importância do lúdico, do brincar em sua formação. Vygotsky afirma que brincar também é um ato social. Como para ele um bebê depende por mais tempo de um adulto para sobreviver nessa fase, no começo da vida, os fatores biológicos superam os sociais, e são os adultos que irão mediar a relação da criança com o mundo, assim, o comportamento da criança dependerá da influência da cultura e dos costumes daquele adulto que a cerca. (MARANHÃO, 2007, p.29). A construção da identidade da criança com deficiência visual, portanto, dependerá da qualidade da relação e da comunicação que ela terá com o adulto e com outras crianças, já que, para ela, a imitação não surtirá efeito algum, já que, a imitação é um comportamento no qual a criança observa e copia o outro.


Vygotsky discorda de Piaget ao dizer que o desenvolvimento não se divide em estágios. Para ele, era preciso observar a criança brincando, aprendendo, para só assim entender os processos humanos superiores. Segundo ele, o homem não nasce com a habilidade de aprender com o passado para interferir no presente, porque só a partir dos três anos a criança é capaz de perceber que algumas situações só poderão ser aprendidas no futuro e outras, imediatamente. É a partir dos 3 anos que a criança começa a estimular a sua imaginação, e a imaginação surge da ação; assim, a brincadeira, o faz-de-conta, é a iniciação da criança no mundo adulto, sendo através das brincadeiras que a criança se desenvolve socialmente, conhece as atitudes e habilidades necessárias para viver em seu grupo social, que o seu desenvolvimento é estimulado, ajudando a criança a aprender e a conviver com as atividades culturais. (MARANHÃO, 2007, p.31)
Assim como Piaget, Vygotsky afirma que a fala introduz mudanças significativas na forma com que a criança se relaciona com as outras funções sensoriais. Quando motivadas pela fala, as crianças com deficiência visual poderão usar as expressões fonéticas, o choro, o riso e a imitação silábica para interagirem e se comunicarem. “A fala, a linguagem, segundo Vygotsky, é a parte essencial do desenvolvimento cognitivo da criança.” (MARANHÃO, 2007 p.32), ou seja,

“A brincadeira constitui uma fonte de desenvolvimento ao criar zonas de desenvolvimento proximal. A Zona de desenvolvimento proximal é a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se determina através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado pela solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes.”
(VYGOTSKY, 1991))



Vygotsky ainda faz uma relação entre aprendizagem e o desenvolvimento. A criança aprende muito antes de ingressar na escola, por isso a participação da família é muito importante, sendo que o desenvolvimento da criança não precisa coincidir com a sua aprendizagem ou com o seu potencial de aprender, pois cada criança tem o seu tempo, seu ritmo, e todas elas já chegam à escola com certo nível de conhecimento. (Ibid, p.33)


Assim como as demais crianças, aquela com deficiência visual precisa ser entendida como um ser singular, com suas especificidades, com tempo e ritmos diferentes, que precisam ser respeitados e valorizados. É preciso entender que criança tem uma forma diferente de ser, de fazer, de compreender e de agir no mundo.


Apesar da brincadeira ser essencial para o desenvolvimento da criança, pois para Vygotsky, “através do brinquedo a criança estabelece suas relações com a vida real.” (MARANHÃO, 2007, p.36), e possibilita que ela elabore e resolva situações conflitantes. O ato de brincar nem sempre é algo prazeroso, pois, as vezes a criança satisfaz apenas algumas de suas necessidades ao usar o brinquedo.


Recentemente, a autora Mara O. de Campos Siaulys junto com o Ministério da Educação e Secretaria de Educação Especial, lançou um o livro “Brincar para todos”, com o intuito de ajudar pais, responsáveis e educadores na aprendizagem e descoberta do mundo para crianças com deficiência visual. No livro ela ensina vários tipos de brincadeiras e jogos que podem ser utilizados desde bebês à crianças maiores, onde cada jogo ajuda em um estágio da criança, passando pela estimulação precoce até a fase de alfabetização.


Alguns desses jogos apresentados no livro, ajudam a criança a adquirir independência para movimentar-se e realizar suas atividades do cotidiano, tais como vestir-se sozinha, amarrar um sapato, e saber se orientar no espaço, aprendendo noção de direita/esquerda, atrás/frente, entre outras. Já outros, são de extrema importância na introdução ao Braille, que além de ajudar as crianças a conhecerem os pontos utilizados no Braille, trabalham a coordenação motora e ajudam no desenvolvimento do sentido de direção e busca.


Existem também os brinquedos que são úteis para a criança se divertir com os números e iniciá-la no aprendizado de conceitos matemáticos. Esses tipos de brinquedos ajudam à criança a adquirir o conceito de número e de quantidade, além da noção de números pares e ímpares.


Esse livro é um material indispensável para aqueles que trabalham ou convivem com crianças em idade pré-escolar e em fase de alfabetização, oferecendo ótimas ideias de brinquedos e brincadeiras que auxiliam no desenvolvimento e na aprendizagem das mesmas, para que elas possam aprender de maneira lúdica e divertida.


Os jogos e as brincadeiras sempre fizeram parte da cultura das crianças, não importa em qual época ou sociedade em que ela se encontre, sendo assim, os jogos estão enraizados no pensamento humano, possibilitando a experimentação, a criação e a reflexão sobre o mundo.


CAPÍTULO 2: DEFICIÊNCIA VISUAL: CONCEITOS PEDAGÓGICOS

Neste capítulo são abordados dois temas relevantes ao atendimento do aluno com deficiência visual na escola. Em um primeiro momento serão apresentadas as diferentes formas de deficiência visual, seus conceitos e causas, enfatizando a importância de se ter um trabalho diferenciado para cada tipo de aluno, levando em consideração o seu tipo de lesão.


Antes de tudo, o profissional precisa saber como são as crianças com deficiência visual, compreender os tipos de deficiência e as necessidades de cada uma para realizar um trabalho adequado às mesmas. Para que isso possa acontecer é preciso que esses profissionais sejam especializados e comprometidos e se coloquem à disposição para que ele aconteça.


Numa segunda parte, será falado um pouco sobre as crianças com deficiência visual na fase escolar, especificamente, na pré-escola e na fase de alfabetização, passando um pouco pelas leis que garantem à elas o direito de estarem em um ambiente educacional, especialmente em classes de turmas regulares, convivendo e interagindo com crianças que não possuem deficiência, mostrando, também, a importância das salas de recursos para o seu desenvolvimento, lembrando, sempre, que o lúdico é um elemento essencial e que deve fazer parte do contexto educacional dessas crianças.


2.1 Deficiência visual: conceituação e implicações


De acordo com a Secretaria de Educação Especial, pessoa com deficiência visual, é aquela que tem “um perda ou redução total da capacidade de ver com o melhor olho e após a melhor correção ótica”. (BRASIL, 1994, p.16). Em suma, é aquele que é incapaz totalmente ou parcialmente de ver, devido a uma imperfeição do sistema visual ou do próprio órgão de visão.


A deficiência visual subdivide-se em Baixa Visão e Cegueira, dependendo do grau e do tipo da perda de visão. A classificação dependerá de onde ocorreu o dano que impede essa visão. Esses danos podem se dar:

1. Na estrutura transparente do olho, como as cataratas e a opacidade da córnea;
2. Na retina, como a degeneração macular e a retinose pigmentária;
3. No nervo óptico, como o glaucoma ou o diabetes;
4. No cérebro.


A deficiência visual pode ser congênita ou adquirida e os danos acima mencionados podem ser causados no nascimento, ou até mesmo antes, no útero da mãe, ou, então, em algum acidente ao longo da vida. Quando uma criança fica cega após os cinco anos de idade, ela já tem desenvolvido, quase que totalmente, seu potencial visual, conservando imagens e memória visual.


A baixa visão também pode ser congênita ou adquirida, e qualquer pessoa com a visão reduzida e não-corrigível, é considerada uma pessoa com deficiência visual. As crianças com baixa visão são as que utilizam seu pequeno potencial visual para explorar o ambiente, conhecer o mundo e aprender a ler e a escrever. Essas crianças se diferenciam muito nas suas possibilidades visuais, embora necessitem aprender a utilizar a visão da melhor forma possível, podem, também, utilizar os outros sentidos ao mesmo tempo para a aprendizagem, aquisição dos conceitos e construção do conhecimento.


A Organização Mundial de Saúde usa as seguintes classificações de deficiência visual. Quando a visão no melhor olho com a melhor correção é possível com o uso de óculos:
. 20/30 a 20/60: é considerado leve perda de visão, ou próximo da visão normal
. 20/70 a 20/160: é considerada baixa visão moderada, baixa visão moderada
. 20/200 a 20/400: é considerado grave deficiência visual, baixa visão grave
. 20/500 a 20/1000: é considerado visão profunda, baixa visão profunda
. Inferior a 20/1000: é considerado quase total deficiência visual, cegueira total ou quase .
Nenhuma percepção da luz: é considerada total deficiência visual, cegueira total.


Existem também os níveis de deficiência visual baseado na perda do campo visual (perda de visão periférica) que apresentam diferentes dificuldades visuais:

. Acuidade visual reduzida:
A criança apresenta dificuldade para ver de longe, precisa aproximar-se bastante para poder ver bem pessoas e objetos, mesmo que utilize recursos ópticos.
. Campo visual restrito: Uma criança que enxerga bem tem um campo visual de 180 graus na horizontal e vertical, o que possibilita interagir, localizar-se e orientar-se bem no ambiente. Já as crianças com baixa visão, dependendo do tipo de problema visual, podem possuir um campo visual bastante restrito, o que pode prejudicar sua orientação e locomoção no espaço. Há crianças que enxergam para baixo, outras apresentam alteração no campo visual central. As alterações de visão periférica prejudicam a visão espacial, a percepção de obstáculos e a locomoção independente.


. Visão de cores e sensibilidade aos contrastes: onde há algumas alterações visuais e a criança é incapaz de distinguir algumas cores, já outras, distinguem cores vibrantes. Há crianças que podem ver objetos, formas e letras com bastante contraste.


. Adaptação à iluminação: algumas crianças apresentam sensibilidade exagerada à luz, porém, existem outras que necessitam de muita iluminação e luz dirigida aos objetos para que possa enxergar melhor.


Falando pedagogicamente, a cegueira leva o indivíduo a necessitar do sistema braile como meio de leitura e escrita, além de outros recursos didáticos e equipamentos especiais para a educação. Já a baixa visão permite ao aluno ler impressos a tinta, desde que sejam empregados recursos didáticos e equipamentos especiais.


Portanto, a deficiência visual possui duas realidades diferentes, conduzindo o educador a desenvolver práticas educativas diferenciadas, no sentido de verificar detalhes específicos para atender especificamente as necessidades do aluno cego ou do aluno de baixa visão.


É muito importante que o professor saiba detectar e diferenciar as causas da perda de visão e os tipos, principalmente, identificar as necessidades específicas de cada aluno, para que, assim, possa trabalhar de maneira correta, no caso da criança com baixa visão, aproveitando ao máximo o resíduo visual, e no caso de crianças cegas, na utilização de métodos adequados.


2.2 A criança com deficiência visual na idade escolar


Em 1961, fundamentado pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN, Lei nº 4024/61, que garante às pessoas com deficiência o direito à educação, de preferência dentro do sistema geral de ensino.


De acordo com a Constituição Federal de 1988, no artigo 205, “a educação é um direito de todos”, garantindo o pleno desenvolvimento da pessoa, o exercício da cidadania e a qualificação para o trabalho. E em seu artigo 208, aponta como dever do Estado garantir atendimento educacional especializado às pessoas de deficiência, na rede regular de ensino.


O artigo 54 do Estatuto da Criança e do Adolescente, inciso III, vem enfatizar o que já foi dito na Constituição de 88, depositando no Estado o dever de assegurar à criança e ao adolescente portadores de deficiência, um atendimento educacional, preferencialmente na rede regular de ensino.


A criança com deficiência visual, seja ela cega ou de baixa visão, tem seu direito pautado na lei de frequentar à escola, seja no espaço educacional especializado, seja na rede regular de ensino.


De acordo com as Diretrizes da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva de 2007, o atendimento educacional especializado tem como função identificar, elaborar e organizar recursos pedagógicos e de acessibilidade, para que assim possam ser eliminadas as barreiras, contribuindo para a plena participação dos alunos, levando em consideração suas necessidades específicas. Essas atividades devem ser diferentes das atividades que são realizadas na sala de aula comum, pois esse atendimento tem como função complementar e suplementar a formação dos alunos, visando sua autonomia e independência dentro e fora da escola.


Daí a importância das Salas de Recursos nas escolas. São elas que irão ajudar no desenvolvimento dessas crianças com deficiência visual, estimulando-as e criando nelas certa autonomia e independência. As crianças que possuem atendimentos nesse ambiente conseguem se desenvolver melhor com a ajuda dos jogos e brincadeiras que a professora utiliza.

“A Sala de Recursos é um ambiente muito importante para o desenvolvimento tanto cognitivo quanto psicológico dessas crianças com deficiência visual. Sala de Recursos é um ambiente de natureza pedagógica, orientado por professor especializado, que suplementa (no caso dos superdotados) e complementa (para os demais alunos) o atendimento educacional realizado em classes comuns da rede regular de ensino. Esse serviço realiza-se em escolas, em local dotado de equipamentos e recursos pedagógicos adequados às necessidades educacionais especiais dos alunos, podendo estender-se a alunos de escolas próximas, nas quais ainda não exista esse atendimento. Pode ser realizado individualmente ou em pequenos grupos, para alunos que apresentem necessidades educacionais especiais, em horário diferente daquele em que frequentam a classe comum.” (MEC – SECRETARIA DE EDUCAÇÃO)


O acesso à educação tem início na Educação Infantil e nessa etapa a ação lúdica, as diferentes formas de comunicação e os estímulos recebidos nos aspectos físicos, emocionais, cognitivos, psicomotores e sociais, ajudam a criança nas relações interpessoais, o respeito e a sua valorização.


Segundo a Organização das Nações Unidas (2007), estima-se que existam cerca de 510 mil crianças com deficiência visual no Brasil na faixa etária de 0 a 12 anos, e os jogos pedagógicos são de extrema eficiência no processo educativo dessas crianças. Nesse período escolar é possível perceber que brincar atinge a criança de uma forma positiva, dando resultado em suas atividades na sala de aula.


“A brincadeira é a vida da criança e uma forma gostosa para ela movimentar-se e ser independente. Brincando, a criança desenvolve os sentidos, adquire habilidades para usar as mãos e o corpo, reconhece objetos e suas características, textura, forma, tamanho, cor e som. Brincando, a criança entra em contato com o ambiente, relaciona-se com o outro, desenvolve o físico, a mente, a autoestima, a afetividade, torna-se ativa e curiosa.” (SIAULYS, 2006 p.10)


Brincar é importante para o desenvolvimento de qualquer criança, e para aquelas que possuem uma deficiência, torna-se fundamental, pois é através do ato de brincar que elas têm a possibilidade de se desenvolverem e, dependendo das brincadeiras oferecidas à essas crianças, elas conseguem assimilar melhor os conteúdos disciplinares, servindo, muitas vezes, no auxílio da leitura e da escrita e, até mesmo, nos conteúdos matemáticos.


A brincadeira constitui a essência do pensamento lúdico, caracterizando as atividades que são executadas na infância. As brincadeiras, por sua vez, representam uma forma de expressão cultural e um modo de interação com diferentes objetos de conhecimento, que implicam no processo de aprendizagem. Sendo assim, o simples ato de brincar acompanha o desenvolvimento da inteligência, do ser humano, das sociedades e da cultura.


O professor de Educação Física do Instituto Benjamin Constant, Antônio João Menescal Conde (1997), enfatiza a importância do lúdico na aprendizagem de crianças deficientes visuais. Ele relata que “a criança cega não é diferente, ela gosta e tem necessidade de brincar, principalmente brincadeiras que trazem em si a necessidade da interação ambiental e interpessoal.” Quando o professor lança mão da ludicidade em suas aulas, a criança se sente acolhida e aceita pelo grupo e, ao passar do tempo, ela mesma vai adquirindo a capacidade de também acolher e aceitar o outro, consolidando os laços afetivos.


Através da brincadeira a criança tem a possibilidade de associar ideias, pensamentos, impulsos e sensações. Ao brincar, a criança com deficiência visual, assim como uma criança que não possui deficiência, mantém vínculos com outros alunos e com os professores, facilitando a sua aprendizagem.



CAPÍTULO 3: A INFLUÊNCIA DOS JOGOS NA EDUCAÇÃO DE CRIANÇAS CEGAS E DE BAIXA VISÃO


Neste terceiro capítulo será apresentado, com base no livro “Brincar para todos” de Mara O. de Campos Siaulys, e em observações realizadas no Instituto Benjamin Constant com alunos da classe de alfabetização, jogos pedagógicos específicos para crianças com deficiência visual em idade pré-escolar e na fase de alfabetização, levando em consideração o tipo de jogo, para cada tipo de deficiência e em que fase ele se adequa melhor.


Faz-se oportuno dividir esse terceiro momento em quatro etapas: a primeira é direcionada a jogos que introduzem as crianças no mundo da ludicidade, ajudando-as a construir uma visão de mundo de uma forma ampla, e ajudam, também, a adquirir autonomia e independência para realizarem suas atividades cotidianas.
Na segunda etapa, serão apresentados jogos que as iniciam na aprendizagem do braile, mostrando os pontos e como eles se compreendem na cela braile; na terceira, serão apresentados jogos que iniciam o aprendizado dos conceitos matemáticos, dando-lhes uma noção de números, de tempo e espaço.


Para fechar esse capítulo, é relevante falar um pouco sobre o que os jogos trazem de mais importante: o simples ato de divertir, resgatando a verdadeira função dos jogos, que é a de interação, de integração entre crianças tanto com deficiência visual como sem deficiência e entre crianças com deficiência visual e adultos. A brincadeira é a atividade fundamental para que a criança desenvolva a sua identidade e autonomia, e o fato dela brincar desde cedo, se comunicando através de gestos, sons, e mais tarde representando determinado papel na brincadeira, faz com que ela desenvolva a imaginação.


Para as crianças com deficiência visual, essa interação, desenvolve algumas capacidades importantes, como a atenção, a memória, além de amadurecer algumas capacidades de socialização, aprendendo a utilizar e a experimentar regras e papéis sociais.



3.1 Os jogos pedagógicos e sua influência no cotidiano da criança com deficiência visual

A criança em idade pré-escolar, antes de qualquer outra coisa, precisa descobrir o prazer de brincar e receber as primeiras informações através da brincadeira, que para a criança com deficiência visual, seja ela de baixa visão ou cega, esse prazer pelo lúdico deve ser intensificado. Para elas existem brincadeiras e jogos específicos para o seu desenvolvimento e esses jogos têm como função despertar a curiosidade e, especialmente, para as crianças com baixa visão, desperta o prazer de ver e melhora a eficiência visual.


O jogo “Sexteto em cores”, por exemplo, é um jogo feito com papelão onde estão colados seis quadrados com figuras bem coloridas, acompanhado de um envelope com seis quadrados com as mesmas figuras do painel para ajudar a criança de baixa visão a identificar cores e objetos já conhecidos de seu cotidiano, além de ajudá-la a entender as posições: direita, esquerda, em cima e embaixo, podendo também, ser trabalhada a oralidade. Através dos quadrados retirados do envelope, a criança pode mostrar, no painel, onde fica a figura desenhada, dizer a cor e/ou inventar uma história com o objeto disposto no quadrado correspondente. Com esse jogo, a criança com deficiência visual, especialmente a de baixa visão, desenvolve a atenção visual para observar detalhes das figuras, além de distinguir figuras e objetos concretos.


Outro jogo bem interessante para ser trabalhado com crianças de baixa visão na pré-escola é o “Bicharada”. O Bicharada é confeccionado em papelão onde é feito um painel branco com duas faces em duas fileiras, onde em uma das faces estão desenhadas em negro as silhuetas dos animais e na outra, está apenas o contorno das mesmas. O jogo acompanha também um envelope com retângulos transparentes com o contorno das figuras. Com esse jogo, a criança aprende a reconhecer as figuras dos animais e seus respectivos nomes, sendo possível também, trabalhar quais são os animais úteis para o homem, seus costumes e alimentação, entre outras informações.


Esses brinquedos desenvolvem a coordenação motora, a atenção visual e ajudam a criança a conhecer objetos do ambiente, seu nome, uso e função, além de desenvolver o jogo simbólico, a brincadeira, o faz-de-conta. Existem também os jogos que ajudam na movimentação e na realização de atividades, no conhecimento e no entendimento do seu corpo e do ambiente e, principalmente, ajudam a desenvolver e integrar os sentidos.


Um desses jogos é o “Body ball”. Ele ajuda a criança a identificar e a nomear as partes do seu corpo e, quando bem adaptado, as crianças cegas o utilizam muito bem. Ele é feito em madeira, com dois painéis brancos, onde em cada um estão coladas figuras de uma menina e de um menino, feitos de tecido e com roupinhas em cores vibrantes, sapatos e meias que se destacam do painel, acompanhado de duas bolinhas pretas de velcro que aderem ao tecido. Ele pode ser utilizado para a aprendizagem das diferenças entre menina e menino pois, além de desenvolver a imagem corporal, o Body ball pode ser trabalhado para ensinar às crianças sobre as quatro estações do ano e o tipo de roupa própria para cada uma.


Em relação à adaptação para a criança cega, o professor poderá fazer cada parte dos bonecos com um tipo de material, para que ela possa então, reconhecer com maior facilidade cada parte do boneco.

Brinquedos como o “Bolsões” e o “1...2... feijão com arroz”, são ótimos para as crianças em suas atividades diárias, ajudando-as a adquirir independência e autonomia. O primeiro jogo é um avental amarelo com dois bolsos frontais azul e vermelho, possuindo na frente três botões vermelhos e nas laterais uma abertura, onde o lado esquerdo é fechado com zíper, e o lado direito, com cadarço. Nos bolsos há objetos de higiene como sabonete, pente, pasta e escova de dentes, entre outros. Com esse jogo, tanto a criança de baixa visão, quanto a criança cega, aprendem a utilizar os produtos de higiene sozinhas, a abotoar, a dar laço em cadarço, adquirem noção de direita e esquerda, desenvolvem o tato para o reconhecimento de forma, textura, tamanho, material, peso e consistência dos objetos, além de outros conceitos.


Já o jogo “1...2... feijão com arroz” é excelente para ajudar a criança cega na hora da refeição. Ele é feito em uma toalha retangular vermelha em tecido de brim duplo. No lado esquerdo superior existe um envelope de tecido preso à toalha onde fica o guardanapo, já no canto superior direito há um suporte para copo em azul de material emborrachado preso com velcro; no canto inferior esquerdo encontramos uma sacola plástica transparente contendo uma colher; no centro, há um círculo em relevo feito em sinhaninha branca sinalizando o local do prato, e sobre esse círculo há um outro de tela emborrachada e tecido preso à toalha por colchetes de pressão. Por fim, no lado direito do prato há uma sacola transparente contendo um garfo e uma faca. Com esse conjunto a criança manuseia e reconhece formas, texturas, tamanhos, cores e tipos de materiais. O professo, nesse caso, poderá servir uma refeição e ensinar à criança cega a reconhecer os alimentos através do tato, olfato e paladar e a aprender os nomes.


Esses jogos mencionados acima são importantes para que essas crianças adquiram independência e autonomia para movimentar-se e realizar as atividades do dia a dia, melhorando a coordenação motora, desenvolvendo habilidades, entre outros benefícios.



3.2 Os jogos pedagógicos na aprendizagem do Braille

Os jogos que introduzem o braile são um excelente recurso para as crianças em período de alfabetização, esses jogos, incentivam, estimulam e favorecem à criança o prazer adequado ao aprendizado. Através da brincadeira, ela descobre como é gostoso aprender a ler. Esses jogos além de melhorarem a coordenação motora, melhoram também o movimento de pinça e encaixe da criança. Com esses jogos, elas adquirem noções básicas de forma, textura, grandeza, peso e consistência, aprendem as letras do alfabeto comum e em braile, além de desenvolverem o processo de alfabetização.


Para a iniciação ao braile, o jogo “Tampadinhas” é uma boa opção, por ser um jogo simples e de fácil manuseio. Ele é feito em uma placa retangular onde estão colocados seis pequenos círculos, obedecendo a disposição dos pontos da cela braile. Cada círculo é feito de um material e textura diferente e em cada círculo podemos encaixar uma tampa recoberta com o mesmo material para uma melhor assimilação. Um pequeno corte identifica o canto superior direito da placa mostrando à criança a maneira certa de ler a cela. Esse jogo, além de familiarizá-la com a cela braile, ajuda a entender o que é lado direito, esquerdo, em cima e embaixo, a reconhecer diferentes formas e texturas, também trabalha a habilidade de tampar e destampar potes. Depois que a criança estiver familiarizada, o professor poderá ensiná-la a forma correta de contar os círculos da placa de acordo com a cela braile:

1 4
2 5
3 6


O “Brailindo” é um ótimo jogo para que a criança aprenda a formar as letrinhas, além de ajudá-la a adquirir o conceito de número e quantidade. Ele é uma régua feita de material leve e macio que possui um pequeno corte que identifica o canto superior direito, que mostra a forma de se ler a cela, possuindo orifícios, agrupados de seis em seis onde cada grupo representa uma cela braile. Ele é acompanhado por 32 pinos coloridos e um o alfabeto braile. O professor deve ajudar a criança a entender que cada grupo de seis orifícios está separado de outro por um corte, contar junto com ela, seguindo a sequência dos pontos braile e explicar, também, que em cada grupo podemos formar uma letrinha. Com os pinos, deixar que ela encaixe à vontade nos buraquinhos, porque, com isso, ela está exercitando seu movimento de pinça e encaixe, e ensinando a ela a escrever a inicial do seu nome.


Com esse jogo, o professor poderá trabalhar a escrita, incentivando os seus alunos a procurar saber como se escreve, por exemplo, as iniciais dos objetos ou pessoas que eles gostem e convivem, estimulando cada vez mais a escrita e a habilidade manual para se ler o braile.


O “Gaveteiro Alfabético” é um outro jogo que estimula a criança, por possuir objetos que ela encontra facilmente em seu dia a dia, enriquecendo, assim, o seu vocabulário, e incentivando a criança a ter curiosidade e vontade de trazer para a sala de aula outros objetos que possuem as iniciais encontradas na frente de cada gaveta. O Gaveteiro Alfabético é uma estante com 24 gavetas dispostas em seis fileiras horizontais de quatro gavetas cada. Em cada gaveta tem uma letra do alfabeto em tinta e em braile, e em cada uma há vários objetos cuja inicial é a letra escrita na frente da gaveta.


Primeiramente, é preferível deixar a criança brincar à vontade com o gaveteiro para que ela possa conhecer o material do qual ele é feito e para conhecer, ou reconhecer os objetos que existem dentro de cada uma e, assim, incentivá-la a produzir pequenas histórias com os aqueles objetos para estimular a oralidade. O Gaveteiro Alfabético ainda estimula a trabalhar a habilidade de utilizar gavetas.
3.3 Os jogos pedagógicos na aprendizagem dos conceitos matemáticos

Assim como os jogos que apresentam às crianças ao braile, existem os jogos que as iniciam no aprendizado dos conceitos matemáticos. Com esses jogos as crianças aprendem os números de uma forma divertida e iniciam o aprendizado das operações matemáticas básicas, a soma e a subtração, enriquecendo também, o vocabulário.


O brinquedo “Numerito” é um gaveteiro de plástico composto de dez gavetas, onde na frente de cada gaveta há um número de um a dez, em braile e em tinta. Nas gavetas do lado esquerdo estão os números ímpares e no lado direito estão os números pares e dentro da cada gaveta há objetos de acordo com o número correspondente à gaveta.

Esse brinquedo ajuda na construção do conceito de número par e ímpar, a conhecer os números em braile e a fazer a relação entre igual e diferente com os objetos que existem nas gavetas, desenvolvendo também, a habilidade tátil para o reconhecimento de forma, textura, tamanho, peso e material de que são feitos cada objeto.


Já o jogo “Uni duni tê” é uma mãozinha amarela feita de material leve e macio, que possui os números de um a cinco na mão esquerda e de seis a dez na mão direita. Os números são escritos em braile e em tinta. O Uni duni tê ajuda a criança a identificar a mão direita, a mão esquerda, além de ensinar na matemática, a contar de um à dez, fazer conta de adição e de subtração. As mãozinhas podem ser utilizadas para ensinar a fazer gestos com as mãos, como dar adeus, fazer o sinal de positivo, ensinar a fazer carinho, entre outros. O professor pode também, trabalhar os membros superiores com os alunos, como, o pulso, o cotovelo, ombros, e os nomes dos dedos e, para que haja uma melhor assimilação, o professor poderá trabalhar esses conceitos através de canções e brincadeiras.


Os jogos acima citados, desenvolvem a estruturação, a organização espacial, isto é, ajuda a criança a se situar no meio em que vive, fazendo relações entre as coisas, observações, comparações, distinguindo semelhanças e diferenças entre elas, noção de direita e esquerda, em cima, embaixo, além de apresentar o conceito de número e quantidade e a noção de par e ímpar.



3.4 O jogo pedagógico: aprendizagem e diversão

Por fim, para terminar, os jogos ajudam no mais importante: a integração. Para finalizar esse capítulo, nada mais rico do que mostrar a verdadeira função dos jogos para crianças com ou sem deficiência visual, a de divertir. Os jogos que serão aqui apresentados divertem e ajudam as crianças cegas e de baixa visão a brincarem com autonomia e independência, além de proporcionarem a integração com outras crianças.


Qualquer criança pode brincar com o dominó, para isso basta que ele seja adaptado. O “Dominó com textura” é feito de material emborrachado com 28 retângulos, onde cada retângulo há um pequeno círculo de cor e textura diferente nas duas pontas. Para que a criança se familiarize com as peças, formas e texturas é preciso que ela antes brinque livremente, possa tocar e sentir cada peça para facilitar na hora do jogo, assim, como em qualquer ocasião, um adulto e no caso da criança com deficiência, ou outra criança a ensine as regras do jogo.


Outro jogo onde há interação é o “Jogo da velha”. O tabuleiro e as peças são feitas em E.V.A e cada item do jogo possui cores que contrastam entre si; é feito de preto, os círculos em vermelho e os X em amarelo e, assim como no dominó, a criança precisa conhecer as peças antes e uma pessoa que enxergue deverá explicar como o jogo funciona.


Porém, para que haja essa interação, é preciso que haja disponibilidade do professor para ensiná-la, contudo, o profissional, além de disponibilidade, precisa receber uma formação especializada para trabalhar com essas crianças. Por não enxergarem, elas necessitam de alguém ensinando como o jogo funciona, com ele é jogado, já que elas não podem se basear pela imitação como as crianças que não são deficientes visuais.


O professor deve incentivar sempre com atividades que desenvolvam experiências integradoras, oportunizar à criança com deficiência a participação em todas as brincadeiras com outras crianças, que as ajudará a construir a autoestima, além de se sentirem incluídas e amadas, pois é na escola que a criança com deficiência visual descobre que ela tem as mesmas oportunidades que as demais, e para muitas delas, é na escola que aprendem a brincar e a conviver em grupo, realizando trocas de experiências em igualdade de condições.


Através desses jogos é possível que a inclusão se faça presente na escola, inclusão essa tão sonhada desde a década de 1980, onde se defende os princípios de direito à igualdade e à diferença, tentando assim, eliminar os processos de preconceito e discriminação que acontecem dentro da escola.


Para concluir, esses jogos são apenas alguns apresentados pela autora, porém, vale ressaltar que, assim como é feito por muitos professores do Instituto Benjamin Constant, professores, pais e responsáveis, podem confeccionar seus próprios brinquedos, adaptando jogos já existentes no mercado ou até mesmo confeccionando com materiais alternativos, para ajudar seus filhos a terem uma vida melhor, para que possam assim, como qualquer outra criança, ter o direito a brincar e se desenvolver com dignidade. O professor, por sua vez, precisa usar toda a sua criatividade para trabalhar com essas crianças, principalmente aqueles professores que não são especializados e que se encontram em escolas que não possuem salas de recursos, e tampouco materiais adequados.



CONSIDERAÇÕES FINAIS

O brinquedo sempre se fez importante para a criança e para diversos adultos que sabem valorizá-lo como um instrumento facilitador da interação e da comunicação, aproximando as pessoas. Atualmente, o brincar provoca um grande interesse nas pessoas da área de Educação, porque descobriram que, através das brincadeiras e dos brinquedos, as crianças se desenvolvem melhor. Não existe melhor forma de interação com a criança, seja ela deficiente visual ou não, do que com a brincadeira.


Para a criança deficiente visual a brincadeira é o caminho mais rápido para a interação, ela tende a se sentir acolhida no meio em que vive, descobrindo também que pode brincar com e como uma criança que não possui deficiência. Através da brincadeira a criança se movimenta, se relaciona, se expressa, aprende sobre o meio em que vive, domina o espaço, conhece a si própria e ao outro, além de desenvolver sua afetividade e autoestima, tornando-se criativa, participante e, principalmente, feliz. Ela se abre com mais facilidade para o conhecimento e a aprendizagem se faz de maneira natural.


Os jogos pedagógicos são excelentes formas de ensinar a criança, pois ela assimila melhor quando tem a oportunidade de trazer para a sala de aula algo que lhe dá prazer. Através da brincadeira, a criança se desenvolve de forma espontânea, interagindo, participando do ambiente e adquirindo principalmente autoconfiança, porém, para isso, é necessário que sejam feitas algumas adaptações nos jogos e brinquedos para que ela possa aprender com métodos adequados à sua realidade.


Esses jogos e brinquedo adaptados, ou que foram produzidos especialmente para essas crianças, tornam o aprendizado algo alegre e prazeroso, facilitam a aquisição de conceitos e habilidades, acima de tudo, ajudam a desenvolver os sentidos e oportunizam o contato com o braile desde muito nova, da mesma maneira que uma criança sem deficiência, com as letras.


A criança com deficiência visual, assim como a criança que não é, precisa viver em um ambiente que estimule a sua alfabetização e letramento, que tenha a oportunidade de viver em um ambiente motivador.


Baseada nos jogos apresentados pela autora Mara O de Campos Siauly, e nas observações no cotidiano dos alunos do Instituto Benjamin Constant, percebi que para uma criança com deficiência visual, principalmente nas classes de alfabetização, os jogos pedagógicos assumem um papel importante na sua formação. Eles são utilizados não apenas como brinquedos para a recreação, mas também como métodos pedagógicos, principalmente com aquelas crianças que tem dificuldades em aprender de maneira convencional. Os jogos, portanto, servem como apoio para o desenvolvimento da leitura e da escrita do aluno, além de ensinar coisas simples, que para uma criança que não enxerga se torna uma dificuldade, como por exemplo, amarrar um cadarço ou abotoar a blusa da escola.


Porém, para que esse aprendizado seja dado de maneira correta é importante que se tenha professores capacitados, ou pelo menos comprometidas com esse trabalho, para ensiná-las a manusearem esses brinquedos, professores que as estimulem a interagir com os outros, que transformem suas salas em ambientes oportunizadores da alfabetização e do letramento.


Assim como diz Rubem Alves: “Professor bom não é aquele que dá uma aula perfeita, explicando muito bem a matéria. Professor bom é aquele que transforma a matéria em brinquedo e seduz o aluno a brincar. Depois de seduzido o aluno, não há quem o segure” Quando o aluno tem a oportunidade de aprender através do jogo, através de algo que lhe dá prazer, que o incentive a querer aprender cada vez mais, o seu aprendizado acontece de maneira natural, sem esforços, ficando assim, guardado em sua mente para a vida toda.




REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARAÚJO, Sônia Maria Dutra de. O jogo simbólico numa proposta pedagógica para o deficiente visual. Rio de Janeiro: Revista Benjamin Constant, Vol. 8, 1997.


ALVES, Fátima. Psicomotricidade: corpo, ação e emoção. 4 ed. Rio de Janeiro: WAK, 2008


BRASIL. Estatuto da criança e do adolescente, 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente: Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, Lei nº 8.242, de 12 de outubro de 1991. - 3ed. - Brasília: Câmara de Deputados, Coordenação de Publicações, 2001


BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva de Educação Inclusiva. MEC/SEESP, 2007


BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Saberes e práticas da inclusão: dificuldades de comunicação e sinalização: deficiência visual. Coordenação geral: Francisca Roseneide Furtado do Monte, Idê Borges dos Santos. Brasília: MEC, SEESP, 2004

BRASIL. Secretaria de Educação Especial. Política Nacional de Educação Especial: livro 1, Brasília: SEESP, 1994


FERREIRA, Aurora. Contar histórias com arte e ensinar brincando: para Educação Infantil e séries iniciais do Ensino Fundamental. RJ: WAK Ed..2007


FIORENTINI, Dario & MIORIM, Maia Ângela. Uma reflexão sobre o uso de materiais concretos e jogos no ensino da Matemática. Texto extraído do Boletim da SBEM SP, n. 7, de julho-agosto de 1990.


KISHIMOTO, Tizuco Morchida. O jogo e a Educação Infantil, São Paulo: Pioneira, 1998

MARANHÃO, Diva Nereida Marques Machado. Ensinar brincando: a aprendizagem pode ser uma grande brincadeira. 4ª ed. Rio de Janeiro. Wak, 2007

MENESCAL, Antônio J. Hoje a aula é de alegria. Rio de Janeiro: Revista Benjamin Constant, Vol. 6, 1997.

SIAULYS, Mara O de Campos. Brincar para todos, Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Especial, 2006

Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.


Flavia Souza do Valle Balonecker

por Flavia Souza do Valle Balonecker

Formada em Pedagogia pela Universidade Estácio de Sá, no Rio de Janeiro. Funcionária Pública Federal, do Instituto Benjamin Constant, um escola que é referência em educação e crianças, jovens e adultos deficientes visuais. Nos últimos 5 trabalhei com uma turma de múltipla deficiência, que é uma área pela qual me apaixonei. Atualmente curso a Pós em Psicopedagogia pelo Portal Educação.

Portal Educação

UOL CURSOS TECNOLOGIA EDUCACIONAL LTDA, com sede na cidade de São Paulo, SP, na Alameda Barão de Limeira, 425, 7º andar - Santa Cecília CEP 01202-001 CNPJ: 17.543.049/0001-93