Evidências Clínicas X Psicossomática

Atualmente, Psicologia e a Psiquiatria movem-se em direção a esta sociedade
Atualmente, Psicologia e a Psiquiatria movem-se em direção a esta sociedade

Medicina

18/10/2012

Conforme França e Rodrigues (2007), em 1952, Wolff, um dos fundadores e presidente da Sociedade Americana de Psicossomática, demonstrou que os distúrbios da relação do indivíduo com o seu meio físico e psicossocial pode gerar emoções desprazerosas e auxiliar no surgimento de inúmeras reações, inclusive na manifestação de doenças. Os autores citam dois importantes estudos de Wolff que merecem destaque: I) sobre a resposta do organismo humano a situações que proporcionam insegurança e hostilidade, aonde foi percebido um aumento do fluxo sanguineo, dos movimentos e da secreção no estômago das pessoas estudadas e

Foram organizados dois grupos, um de sujeitos com distúrbios de estômago e outro com pessoas sem comprometimento físico. Ambos foram submetidos a uma situação de estresse agudo. Verificou-se que em ambos os grupos apresentaram respostas físicas, como aumento da produção de ácido clorídrico, de muco e dos movimentos do estômago e da produção da pepsina (que é a enzima do suco gástrico que ajuda no processo digestório). Em termos dos processos mentais, houve um aumento da ansiedade, da insegurança e de sentimentos de culpa, entretanto, no grupo que já apresentava um comprometimento físico, as reações de forma muito mais intensa.

Dessa maneira, Wolff demonstrou que o medo e a angústia podem aumentar as tensões cardíacas, musculares e digestivas. Como exemplo esquemático para o que foi levantado no estudo II, temos a seguinte configuração:

Sabe-se hoje que há uma intensa luta do organismo para se adaptar ao seu meio social e biológico. Deste modo, as reações de estresse fazem parte do cotidiano. Porém, Cooper (1988) destacou alguns indicadores de estresse que demonstram a dinâmica psicossomática:

Frente a uma situação de doença, há a necessidade de se investigar as possíveis situações de conflito que estão ocorrendo com o indivíduo, seja com ele mesmo, seja com a circunstância em que ele está submetido, visto que o conflito pode propiciar o advento de emoções, as quais possuem potencial para originar transtornos nas funções orgânicas, que, ao se tornarem repetitivos e persistentes, podem alterar a vida celular. O resultado deste processo são lesões orgânicas que geram enfermidades. Para Selye (1965), um dos maiores estudiosos sobre as reações de stress, as doenças de adaptação são uma consequência do excesso de hostilidade ou de uma demasiada submissão.
Segundo o Prof. José Fernandes Pontes (1987), um dos fundadores e ex-presidente da Associação Brasileira de Psicossomática, além de conhecido como o percussor da gastroenterologia brasileira, as emoções são fenômenos que ocorrem de forma simultânea no corpo e nos processos mentais, expressando-se de modo concomitante via modificações das funções motoras, secretoras e na irrigação dos órgãos. Segundo o autor, o conjunto de reações é coordenado pelo sistema nervoso central e, fundamentalmente, por um conjunto de estruturas cerebrais conhecidas como eixo hipotálamo-hipófise e sistema límbico.

Foram identificados alguns sintomas decorrentes das funções dos órgãos, entre eles alguns resultantes das alterações das funções das fibras musculares lisas que provocam:
I) no aparelho digestório  vômitos, diarréia, prisão de ventre, alterações da motilidade do estômago e intestinos;
II) no aparelho respiratório asma e bronquite;
III) no aparelho genito-urinário dor ao urinar, cólicas menstruais, colinas renais, aumento da frequência urinária, vaginismo e ejaculação precoce;
IV) no aparelho circulatório hipertensão arterial, enxaqueca e cefaléia de tensão;
V) na pele neurodermites, eczemas e pruridos.

Caso a alteração for principalmente secretora, há modificações:
1) na produção de muco;
2) da secreção das glândulas endócrinas;
3) na produção de hormônios do aparelho digestório;
4) da secreção do pancreática;
5) da secreção biliar e
6) da secreção entérica.
Caso haja demasiada alteração da função de irrigação dos órgãos, ocorre a diminuição da resistência da mucosa, tornando o organismo vulnerável ao surgimento de agentes agressivos, o que pode resultar em hemorragias e ulcerações.

As alterações dessas funções (motora, secretora e de irrigação), as quais se expressam via sintomas mencionados sucedem-se em combinações múltiplas, advindas das mais diferentes situações vivenciadas por um indivíduo, como: raiva, medo, dor, mal-estar, fome, humilhação, desalento, desesperança, tristeza, melancolia, depressão, etc. E suas manifestações clínicas são as mais diversas.

Para França e Rodrigues (2007) há dados já comprovados cientificamente que não podem ser mais ignorados e deveriam servir como um alerta às autoridades. De acordo com os autores, a porcentagem de pessoas com problemas psiquiátricos chega a 25% nos consultórios de clínica geral, sendo que alguns autores ingleses apontam que este número é bem maior, cerca de 33 a 60% de pessoas são acometidas por doenças psiquiátricas entre a população, visto que muitos não são diagnosticados nos serviços de atenção primária à saúde devido a diversos fatores. Os autores ingleses ressaltam que os sintomas mentais, muitas vezes, não são relatados pelos pacientes e/ou não são investigados pelo médico no momento da consulta, como uma forma de conluio, como se ambos decidissem por centrar o problema somente em razões físicas. Alguns dados que chamam atenção:

- 52% das pacientes ginecológicas possuem problemas psiquiátricos;
- 75% dos pacientes que frequentam os serviços de cuidado primário nos EUA apresentam problemas psicossomáticos decorrentes de estresse psicossocial;
- 2 a 4% da população mundial têm problemas de ansiedade com a necessidade de tratamento médico;
- só na Suécia 13% da população adulta apresenta problemas de ansiedade psiquiátricos;
- nos EUA, 5 a 10% da população sofre com problemas psiquiátricos, sendo que a maior causa de suicídios é devida à depressão;
- pelas estimativas da Organização Mundial de Saúde há 200 milhões de pessoas no mundo com depressão, entretanto apenas 12 a 15% se procuram tratamento, e isso é particularmente verdadeiro ao nos referirmos aos pacientes portadores de “síndromes psicossomáticas” ou que apresentam as conhecidas doenças de adaptação;
- 20% de consultas médicas no Reino Unido são de pessoas que apresentam problemas depressivos, mas somente 1/6 recebem auxílio especializado. Esta situação é extremamente grave, já que a depressão pode aumentar enormemente o risco de morte, principalmente se estiver associada a outra doença;
- pesquisas apontam que pacientes deprimidos ficam 25% do tempo a mais internados no hospital e demoram bem mais para retornar às suas atividades profissionais;
- nos EUA, o custo financeiro da depressão (que inclui gastos que estão relacionados desde o tratamento até as tentativas de suicídio e prejuízos da atividade profissional) chega a 43,7 bilhões de dólares por ano;
- no Reino Unido os gastos com o tratamento para a depressão chegam a 333 milhões de libras esterlinas;
- a prescrição de tranquilizantes cresceu cerca de 65% desde 2004, sendo que os clínicos gerais e os cardiologistas são os maiores responsáveis por prescrever este tipo de medicamento, o que mostra que a grande maioria dos pacientes vêm buscando auxílio em consultórios não psiquiátricos, já que muitas vezes seu sofrimento mostra-se principalmente no nível corpóreo.

Situações como as apontadas acima já não podem ser mais ignoradas. Paulatinamente, a sociedade e a Medicina estão se livrando dos preconceitos que carregaram durante séculos em relação às necessidades psíquicas do seres humanos. Atualmente, Psicologia e a Psiquiatria movem-se em direção a esta sociedade, alçando uma maior amplitude em seus campos de atuação.

Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.


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