BRIGA PELA AUDIÊNCIA: VALE TUDO?

VALE TUDO?
VALE TUDO?

Marketing e Vendas

03/02/2015

Ano após ano nos deparamos sempre com a mesma coisa na televisão: a briga pelos índices de audiência. A qualidade da programação das maiores emissoras é cada vez mais questionável. Comecemos a refletir sobre o motivo dessa briga.


Aprendi na universidade que o motivo para a perseguição de um índice cada vez maior de audiência é exclusivamente comercial. Engana-se quem pensa que as emissoras querem somente a companhia do público. A lógica é quanto mais audiência, mais resposta à visibilidade dos anunciantes, maior o retorno deles e maior o investimento em anúncios.


Ou seja, anúncio é sinônimo de dinheiro para pagar os custos de produção. Todo esse círculo interfere tanto na qualidade das telenovelas e de outros programas de entretenimento quanto nas pautas do jornalismo.


Em um mundo capitalista, os veículos de comunicação, inclusive os jornalísticos precisam dos anúncios e de assinaturas para se manterem, mesmo com os altos custos de produção. Os jornais vendem exemplares assinados e a televisão conta com as operadoras de TV a cabo.


Mas isso é motivo para as emissoras de TV aberta terem o nível de programação tão questionável? Não, pois a programação apelativa demais pode ter o efeito contrário: a perda de audiência depois de anos com índices altos. Em reportagem de Paulo Pacheco para a coluna do jornalista Daniel Castro no UOL.


A matéria de agosto de 2014 mostra que de cada dez telespectadores que o programa “Pânico” tinha em 2009, o pânico perdeu quatro. O programa humorístico atingiu 5,3 pontos na Grande São Paulo. De acordo com a coluna, esse índice é o pior da história do humorístico.


Com essa crise e pelo motivo comercial que apontei anteriormente, a direção do Pânico precisou realizar cortes, demitindo modelos e transformando atores em freelancer. Além da concorrência, as pautas humorísticas do programa estão notavelmente mais apelativas para a nudez nos últimos anos.


Algumas vezes, a equipe de apresentadores contribui para o alto índice de audiência e o “Pânico” provou esse efeito. A audiência caiu ainda mais após a ida da apresentadora Sabrina Sato para a Record. Brigas com artistas de outras emissoras e processos fecha o quadro da queda livre do humorístico.


Vários programas de diversos gêneros e emissoras de televisão estão passando pelo mesmo processo. Que não se lembra dos cinco anos de sufoco passados pelo “Domingão do Faustão” enfrentando o “Domingo Legal” na época apresentado pelo Gugu Liberato. Em um dos dias da briga pelo Ibope, houve pautas apelativas no dominical da Globo.


Lembro-me de duas: um proprietário de restaurante japonês que serve sushi no corpo de sua esposa nua. Questões morais à parte, houve críticas por motivos de higiene. Não sei o que aconteceu com o dono do restaurante, mas sei as consequências dessa e de outro assunto.


Trata-se de um teste para ver quem tinha os glúteos maiores: Carla Perez ou Scheila Carvalho. É um assunto sem sentido, mas há quem acredite que vale tudo na briga pela audiência. Mas o efeito foi o contrário do esperado pela emissora: a audiência caiu ainda mais. Anos depois, um dos produtores do programa foi demitido por passar informações para o programa concorrente.


Essa troca de informações se esbarra no Código Penal, que prevê penas de multa e prisão para quem passar informações que forem consideradas pela lei como confidenciais, de acordo com os artigos 152, 153 e 154.


Mas a troca de informações e o apelo para nudez não são as únicas práticas para ganhar pontos no medidor do Ibope: apelo ao assistencialismo; mostrar a tragédia alheia e o excesso de pautas sangrentas são outras práticas bastante comuns.


É comum se deparar com quadros em que as pessoas são “ajudadas” em suas necessidades, por exemplo uma casa, um carro,  volta para o lugar de origem. Quem não se lembra do caso da grávida de Taubaté, que foi até mesmo levada a um programa de TV, recebeu doações acabou processada por estelionato: os quadrigêmeos não existiam. O processo foi arquivado, mas as emissoras precisam ter cuidado com esse tipo de pauta.


Volta e meia, o processo de recuperação do ator Gérson Brenner é exibido em programas sensacionalistas. O ator se recupera de sequelas de um assalto sofrido na rodovia Presidente Dutra, no sentido Rio. Ele ia de casa para a sede da Globo onde gravaria um capítulo da novela Corpo Dourado.


De acordo com notícia do portal BOL, o drama foi exibido nos programas “A Tarde é Sua”, da apresentadora Sonia Abrão na RedeTV e pelo programa “Tá na Tela”, do apresentador Luiz Bacci na Band (hoje o programa não está mais no ar).


As tragédias alheias e as pautas sangrentas tomam conta dos noticiários policiais. Um exemplo foi uma explosão dos índices de audiência por uma emissora afiliada da TV Record no Nordeste. A TV Correio, da Paraíba por meio do programa “Correio Verdade” apresentado por Samuka Duarte exibiu uma reportagem.


Além de apelar pelo sangrento e pela tragédia, o programa ficou famoso em 2013 pela cobertura dos protestos na Paraíba. O motivo? Imagens aéreas da manifestação. Mas um dos compromissos jornalísticos foi deixado de lado. O apresentador afirmou que as imagens eram exclusivas, mas não passava de uma montagem, descoberta por um dos concorrentes: o programa do apresentador Fábio Araújo da TV Tambaú, afiliada do SBT.


De acordo com reportagem de Gabriel Vaquer do site Na Telinha, a imagem não foi obtida por helicóptero, mas por uma câmera instalada em um prédio próximo. Isso fez o programa ser alvo de piadas na internet.


Mas todas essas práticas são resultado da pressão que os profissionais sofrem para aumentar os índices de audiência. Isso não justifica o uso de práticas tão imorais e inadmissíveis no meio jornalístico, mas explica porque o programa citado mentiu e porque a reportagem do PCC no “Domingo Legal” quase levou Gugu Liberato à justiça. Para que não se lembra, eu explico.


Não me lembro de quando isso aconteceu, mas a repercussão foi grande. Apareceram indivíduos com rostos cobertos, se dizendo do PCC e ameaçando de morte o apresentador. Dias depois, a justiça descobriu que não eram membros do PCC e o diretor do programa foi acusado de fraude.


Ainda a respeito da pressão sobre diretores, produtores e apresentadores (parte da justificativa para essas práticas) foi sentida pelo ator e apresentador Mário Frias, durante os tempo de RedeTV.


Para o UOL entretenimento, o ator (falando da contratação pela Globo para o elenco de “Malhação”) relatou à repórter Marcela Ribeiro que sofreu com a busca incessante por audiência. O apresentador comandava o programa “O Último Passageiro” no domingo em torno das oito da noite e que premiava a escola vencedora com viagem de formatura. Por comandar o programa todo sozinho, a carga de pressão era toda sobre ele e isso abalou seu emocional.


Agora, vamos analisar o que diz o código de ética jornalística e que vale para outras habilitações da comunicação. Os dois primeiros incisos do artigo 2 afirmam que a informação deve ser correta, precisa e a apuração deve ser pautada pela veracidade dos fatos. Isso não aconteceu no “Domingo Legal” em relação ao PCC, não ocorreu na cobertura do “Correio Verdade” e é o que cometeu a grávida de Taubaté, com a contribuição do descuido dos programas onde ela apareceu.


Além disso, o segundo inciso do artigo 11 mostra que o profissional não pode divulgar informações de caráter mórbido, sensacionalista ou contrário a valores humanos, especialmente em coberturas de crimes ou acidentes. Esse artigo foi desobedecido pelo “A Tarde é sua” pelo “Tá na Tela”. Não houve crime no momento, mas estavam mostrando uma pessoa que sofreu as consequências de um crime.


As matérias apelativas do “Pânico” e “Domingo Legal” não são coberturas de crimes, mas são contra os valores humanos por incitarem a falta de higiene, além da pornografia.

 

Para terminar, quem quiser pode acessar os Links a seguir para ter detalhes de algumas situações aqui relatadas:

BOL Notícias:

http://noticias.bol.uol.com.br/ultimas-noticias/entretenimento/2014/11/14/na-briga-por-ibope-bacci-e-sonia-abrao-exibem-reportagens-sobre-brenner.htm Fenaj: http://www.fenaj.org.br/federacao/cometica/codigo_de_etica_dos_jornalistas_brasileiros.pdf

Na telinha:

http://natelinha.ne10.uol.com.br/noticias/2014/10/29/afiliada-da-record-conquista-audiencia-incrivel-com-programa-policial-81755.php

Notícias da TV:

http://noticias.bol.uol.com.br/ultimas-noticias/entretenimento/2014/11/14/na-briga-por-ibope-bacci-e-sonia-abrao-exibem-reportagens-sobre-brenner.htm

UOL entretenimento:

http://televisao.uol.com.br/noticias/redacao/2014/06/27/mario-frias-volta-a-globo-e-fala-de-pressao-na-rede-tv-briga-pelo-ibope.htm

Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.


Gislaine Chagas da Silva

por Gislaine Chagas da Silva

Trabalhou como repórter voluntária do programa de TV A Boa Notícia, da Diocese de Santo André veiculado no canal Eco TV. Atualmente faz consultoria para trabalhos acadêmicos como autônoma.

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