Schistosoma mansoni - Hematelmintos

Formas clínicas de S. mansoni
Formas clínicas de S. mansoni

Farmácia

24/04/2013

Os trematódeos do gênero Schistosoma (classe Digenea) são parasitos dos plexos venosos da parede intestinal ou da bexiga, onde causam inflamação e fibrose. A doença recebe os nomes de esquistossomíase, esquistosomose ou bilharziose, dependendo seu quadro clínico da espécie de helminto em causa.

As espécies principais, para a patologia humana são:


a) S. mansoni - causa a esquistossomíase intestinal ou mansônica e é a única que ocorre no Brasil, visto não existirem aqui os moluscos vetores das demais espécies.
b) S. haematobium - causa a esquistossomíase urinária ou hematóbica, da África e Oriente Médio.
c) S. japonicum - causa a esquistossomíase japônica, da Ásia.

O S. mansoni caracteriza-se por ter os sexos separados e um acentuado dimorfismo sexual. O macho mede cerca de 1 cm de comprimento e sua extremidade anterior, que é aproximadamente cilíndrica apresenta 2 ventosas: a oral e o acetábulo. O restante do corpo enrola-se ventralmente de modo a formar um canal longitudinal - o canal ginecóforo - onde a fêmea adulta está normalmente inserida. O tegumento do macho é inteiramente revestido de espinhos e tubérculos; estes muito destacados ao longo do segmento posterior. A fêmea é delgada e cilíndrica em toda sua extensão, mais longa que o macho e tem o tegumento praticamente liso. Suas ventosas são pequenas. Seu tegumento sincicial é complexo e revestido por uma dupla membrana, que se renova continuamente.

O tubo digestivo inicia-se com a boca, na ventosa oral, e com um curto segmento anterior que se bifurca para trás da ventosa ventral ou acetábulo. Ele volta a unir-se posteriormente, para formar um intestino ou cécum único, em ambos os sexos.

Os Schistosoma nutrem-se do sangue que ingerem, mas também o fazem por pinocitose, por meio do tegumento. Muitas proteínas do hospedeiro são incorporadas ao glicocálix superficial e permitem aos helmintos camuflarem-se frente ao sistema imunológico do hospedeiro.

O sistema reprodutor masculino compreende um testículo com 6 a 8 lóbulos e um canal deferente que se dilata formando a vesícula seminal. Não há cirro. Ele se abre no início do canal ginecóforo. O sistema reprodutor feminino é formado por ovário único, oviduto, que se une com o canal das glândulas vitelogênicas, antes do oótipo e útero. Este se abre em um poro genital, pouco atrás do acetábulo. As fêmeas fecundadas põem um ovo por vez, estimando-se que cheguem a 300 por dia. Os ovos gastam 6 ou 7 dias para formarem seus embriões e devem sair para a luz intestinal dentro de uns 20 dias. Caso contrário, morrem.
Biologia de S. mansoni

O ovo do S. mansoni possui duplo envoltório:

a) Casca externa formada por escleroproteínas mostra um espinho lateral característico;
b) A interna é o corium, um envoltório embrionário.

Em geral, ele já contém o embrião formado, quando eliminado com as fezes. Pode-se comprovar se ele ainda está vivo pela movimentação ciliar de suas 4 células excretoras (solenócitos), ou do miracídio como um todo. No meio externo, o ovo pode sobreviver de 2 a 5 dias, em fezes formadas, devendo logo ganhar o meio líquido. Não suporta a dessecação.

Em contato com a água (meio hipotônico) o ovo entumece por endosmose, rompe-se e libera o miracídio. Este tem forma alongada e é revestido por um epitélio ciliado que lhe permite nadar rapidamente, percorrendo grandes círculos. Apresenta uma saliência cônica anterior, onde se abrem as glândulas de penetração. O miracídio possui um esboço de sistema nervoso e papilas sensoriais, 2 pares de células excretoras - os solenócitos - com seus canais, além de células embrionárias. Sua expectativa de vida é curta, devendo penetrar em um molusco no mesmo dia da eclosão. Apresenta acentuado fototropismo, pelo que tende a nadar próximo da superfície líquida.

Esta larva passa a nadar em círculos cada vez menores, se por perto encontrar um molusco do gênero Biomphalaria; o que aumenta as chances de um encontro. Ao invadir o molusco, graças a suas glândulas de penetração, o miracídio perde seu epitélio ciliado e se transforma em uma estrutura sacular, o esporocisto I. No seu interior, geram-se os esporocistos II que migram para o hepatopâncreas ou ovotestis do molusco, onde passam a formar milhares de cercarias. Decorridas seis semanas ou mais, começa a expulsão diária de cercárias. Entretanto, depois de certo tempo, o esporocisto II volta a produzir nova geração de esporocistos que retomam a formação de cercárias, o que pode repetir-se periodicamente enquanto durar a vida do molusco.

Assim:

Esporocisto I
Esporocistos II → cercárias
Esporocistos III → cercárias
Esporocistos IV → cercárias
Esse processo explica a produção intermitente de cercárias pelos moluscos infectados. A partir de um único miracídio, muitas pessoas podem vir a ser infectadas pelas cercárias que se encontram na água e penetram pela pele, por vezes em grande número.

A cercaria tem corpo piriforme e uma cauda bifurcada (fucocercária) cuja vibração arrasta o corpo atrás de si, nadando quase sempre em direção à superfície (geotropismo negativo). O corpo possui duas ventosas (oral e acetabular), um esboço de tubo digestivo, um conjunto de glândulas de penetração e pares de solenócitos. A eliminação de cercárias pelos moluscos obedece a um ritmo circadiano, regulado pela luz. Inicia-se por volta das 9 horas da manhã, com pico em torno das 11 horas (em linhagens humanas) e declina em seguida. Deduz-se que o período de alto risco de infecção pelo Schistosoma mansoni, para as pessoas que frequentam os focos e se põem em contato com a água, está compreendido entre as 9 horas da manhã e o anoitecer. Em águas estagnadas há progressivo acúmulo delas, ao longo do dia. Seu poder infectante dura cerca de 8 horas, e diminui em seguida, ainda que, no laboratório, elas possam manter-se vivas por 2 ou 3 dias.

Durante a penetração através da pele do hospedeiro vertebrado, as cercárias abandonam a cauda, tornam-se alongadas e seu tegumento modifica-se. Nessas condições passam a chamar-se esquistossômulos e resistem à ação lítica do meio. Os que não foram destruídos na pele, nos 2 ou 3 primeiros dias, penetram em um vaso e são levados pela corrente circulatória até o sistema venoso intra-hepático, condição para que possam desenvolver-se até vermes adultos, machos e fêmeas.

A fêmea amadurece só depois de acasalada com um macho e instalada definitivamente no canal ginecóforo deste. Então, graças à musculatura dos machos e aos seus espinhos tegumentares, que lhes garantem apoio na parede dos vasos, migram contra a corrente sanguínea do sistema porta e vão localizar-se, de preferência, nos ramos finos do plexo hemorroidário superior, na mucosa intestinal. Aí chegam pela 4ª semana ou depois. Como as fêmeas insinuam-se pelos capilares mais delgados e aí depositam seus ovos, acabam por obstruí-los e desorganizá-los. Razão porque os ovos ficam livres no tecido conjuntivo e depois são expulsos para a luz intestinal e evacuados com as fezes.

Caso os ovos permaneçam na mucosa sem sair, seus produtos desencadeiam uma reação inflamatória local de tipo granuloma. Isto é: de início, numerosos macrófagos seguidos de eosinófilos, linfócitos e alguns plasmócitos cercam o ovo. Alguns macrófagos fundem-se e formam gigantócitos, que envolvem o ovo e começam a digeri-lo. Morto o embrião, diminuem os granulócitos e multiplicam-se aí os fibroblastos (derivados de macrófagos) que assumem disposição em camadas circulares concêntricas e começam a depositar fibras reticulares e colágeno com igual disposição. Por fim, os fibroblastos cessam sua produção de colágeno e se tornam simples fibrócitos. As escleroproteínas da casca ovular ainda tardam algum tempo para desaparecer. O resultado é a formação de uma estrutura cicatricial fibrosa. Com a acumulação de granulomas, a mucosa intestinal vai ficando fibrosada. À medida que os capilares mais próximos da superfície mucosa vão sendo substituídos por tecido fibroso, os vermes passam a ficar instalados mais próximos da submucosa. Aí, por serem os vasos de maior calibre, os ovos são mais facilmente arrastados pela corrente sanguínea do sistema porta em direção ao fígado, onde serão retidos nos espaços porta.

Formas clínicas de S. mansoni

A penetração das cercárias pode acompanhar-se de dermatite, com exantema, prurido ou manifestações alérgicas locais.

Em torno dos parasitos acumulam-se polimorfonucleares e depois linfócitos e macrófagos. Muitos parasitos morrem aí. A reação mantém-se por 2 ou 3 dias e regride em seguida.

Nos pulmões e fígado pode haver manifestações discretas e passageiras, quando lá chegam os esquistossômulos. A morte destes produz inflamação, necrose e depois cicatrização. Conforme o número de parasitos e a reação do paciente pode haver febre, eosinofilia, linfadenite, esplenomegalia e urticária, duas a três semanas depois. O quadro é dito forma toxêmica da esquistossomíase. Mas nem sempre está presente.

A esquistossomose crônica pode ser distinta nas seguintes fases:

a) Fase intestinal: na maioria dos casos, a infecção permanece silenciosa enquanto a carga parasitária for baixa e a acumulação de ovos nos tecidos pequena. O aumento de vermes faz-se, em geral, pouco a pouco, pois só parte dos esquistossômulos chega à fase adulta. Os pacientes levam anos (em geral 10 ou mais) para atingirem um máximo de carga parasitária. De início, os ovos predominam na mucosa do intestino distal e o paciente apresenta uma retocolite, com evacuações frequentes acompanhadas de tenesmo e ardor ao defecar.

b) Fase hepatointestinal: à medida que os helmintos forem migrando para a submucosa e seus ovos arrastados para o fígado, a patologia se agrava. A sintomatologia pode seguir a mesma, mas o déficit orgânico manifesta-se por ocasião de sobrecargas fisiológicas (alimentares, trabalho exaustivo, entre outras). Ocorre então má digestão, sensação de plenitude gástrica pós-prandial, flatulência e inapetência, podendo haver, também, mal-estar, nervosismo, desânimo e emagrecimento. O fígado e, sobretudo o baço aumentam de tamanho. O quadro clínico evolui lentamente, até que a fibrose hepática pré-capilar comece a dificultar a circulação portal intra-hepática. Surgem então hipertensão no território da veia porta, maior esplenomegalia, edemas e ascite, bem como circulação colateral entre o sistema porta e o das veias cavas. Formam-se varizes esofagogástricas e há tendência a hemorragias (hematêmeses), que podem ser graves. Casos de desnutrição tornam o quadro clínico mais grave. Em consequência das lesões hepáticas e esplênicas, há hipoproteinemia, anemia, leucopenia, plaquetopenia e deficiência da coagulação.

Ovos levados para os pulmões, pela circulação colateral, produzem fibrose pulmonar e fístulas arteriovenosas pré-capilares. Há cianose e evolução para uma forma da doença com insuficiência cardíaca, dita cor pulmonale esquistossomótico. Localizações de ovos, ou até de vermes erráticos, na medula espinhal, mesmo em casos de infecções leves, podem determinar processos inflamatórios e fibróticos que causam quadros hemiplégicos graves. A associação de esquistossomíase com o vírus da hepatite B parece responsável pelas formas mais graves da patologia hepática nessa helmintíase.

Diagnóstico laboratorial da esquistossomose mansônica

Contribuem para que se suspeite desta doença o fato do paciente proceder de uma zona endêmica ou de ter visitado um foco conhecido e nele se banhado, se o quadro clínico for compatível com os da esquistossomíase. Entretanto, os variados quadros que a infecção por S. mansoni costuma produzir podem ter outras causas, nenhum sinal ou sintoma lhe sendo específico.

Os métodos laboratoriais são, portanto, essenciais para o diagnóstico. Eles podem ser:

a) Coproscópicos: busca de ovos do helminto nas fezes, para o que se dispõe de várias técnicas; ou o método de eclosão de miracídios.
b) Imunológicos: demonstração da presença de anticorpos ou de antígenos de S. mansoni no soro, por técnicas sorológicas; ou pela intradermorreação.
c) Exame histopatológico: em amostra de biópsia retal.

O diagnóstico pelo exame de fezes é feito pelo método de Kato-Katz. Outro método eficiente é o de sedimentação espontânea.

As técnicas de diagnóstico imunológico são pouco utilizadas, seja por manterem-se positivos durante muito tempo após a cura do paciente, seja pela pouca sensibilidade e especificidade ou pela complexidade técnica de sua aplicação. Os mais simples permitem fazer uma triagem de casos prováveis em áreas com pequeno número de pessoas infectadas, com carga parasitária baixa e com escassa eliminação de ovos.
A serem confirmados, depois, pelo exame de fezes.

a) Técnica de Elisa.
b) Reação intradérmica – Sensibilização cutânea específica que se manifesta entre 4 e 8 semanas depois da infecção. A injeção intradérmica de um extrato do verme produz pápula com mais de 1 cm de diâmetro, com “pseudópodes”. Ler o resultado de 15 a 20 minutos depois. A reação é fraca em crianças e mulheres jovens, mas persiste nos adultos depois da cura. Há 5% de falsos positivos e reações cruzadas com alguns outros helmintos.

Para confirmação de cura em estudos clínicos, é utilizado o exame de biópsia retal. Esta é uma técnica invasiva, pois exige a retirada de um fragmento da mucosa intestinal, ao nível das válvulas de Houston. Depois de lavado, o fragmento é comprimido entre duas lâminas e examinado ao microscópio.

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