Carne pra que te quero

Ao ponto?
Ao ponto?

Biologia

15/05/2015

Não comemos apenas para matar a fome. Decidir o que iremos colocar no prato é uma escolha cada vez mais influenciada por questões econômicas, ambientais, culturais e até religiosas. A preocupação em reduzir o consumo de carne fez aumentar o interesse pelo vegetarianismo no mundo inteiro, levando ao grande crescimento da indústria de produtos naturais. Mas, por que estamos deixando a carne de lado? Imagine a faca cortando um belo e suculento pedaço de piranha crocante, dourada e úmida por dentro. Ao mastigar devagar, sente-se o tempero, a maciez e um sabor incomparável.


Afirmo, carne é uma delícia. Mudando a perspectiva desse olhar, visualize o prato agora com um pedaço de músculo, amputado da região pélvica de um animal já abatido. Com a mesma faca, você separa os feixes musculares e coloca o tecido morto na boca. Nós recusamos a aceitar que a comida em nosso prato um dia foi um animal e estamos comendo um cadáver. A diferença entre a carne branca e a vermelha é a quantidade de ferro no tecido. O Ferro é o mineral que dá a tonalidade vermelha ao sangue. Pelo fato de peixes e galinhas terem o corpo menor, não armazenam grandes nutrientes nas células e com isso menos ferro. Animais mais velhos têm a carne mais vermelha. Por isso frangos industrializados apresentam a carne bem branca, pois são abatidos antes dos dois meses, pouco tempo para acumular o ferro na carne.


Vamos ao censo dos animais: No mundo há aproximadamente 1,35 bilhão de bois e vacas, 930 milhões de porcos, 1,7 bilhão de ovelhas e cabras, 1,4 bilhão de patos, gansos e perus, 170 milhões de búfalos. Quase equivalente à população humana. Fora os 14,85 bilhões de frangos no mundo inteiro abastecendo, involuntariamente, nossas mesas.


Somos o quarto país que mais come carne. Uma família de cinco pessoas devora uma vaca em 12 meses. Um brasileiro come em média 32 quilos de frango e 11 quilos de carne suína todo o ano.


Quem consome mais carne vermelha tem índices maiores de infarte e câncer, as duas principais causas de morte no mundo. A maior parte da comunidade médica acredita na malignidade da carne vermelha, e ninguém duvida que os vegetais façam bem à saúde. Uma alimentação à base de verduras, frutas e legumes reduzem as chances de câncer na boca, estômago, intestino além de afastar os ataques cardíacos. Ser vegetariano exige cuidados com a nutrição, mais atenção no que é consumido e nos efeitos causados no organismo, o que ajuda a ter hábitos saudáveis. Vários nutricionistas aconselham as crianças a não ficarem sem proteína animal para não correrem o risco de terem seu desenvolvimento cerebral comprometido.


Um termo muito comum hoje é vegano. Os veganos são um tipo de vegetarianos que não consomem nada de origem animal: carne, ovos, leite, mel. E as roupas de couro, lã e seda também estão proibidas. Para eles a base de tudo está na soja. A soja é o vegetal que possui as proteínas mais completas. Um desafio para os veganos é obter a vitamina B12, que o nosso corpo não consegue produzir sozinho e não existe em nenhum vegetal. A vitamina B12 é fabricada por bactérias encontradas somente nos animais que se alimentam de pastos. O homem por ser onívoro, possui os dentes pequenos e o sistema digestivo curto e por isso nosso organismo está preparado para comer de tudo. Os chimpanzés também, que além de plantas, se alimentam de insetos, pequenos roedores e lagartos. Diferente do gorila, que só come plantas, tem dentes imensos e uma barriga enorme (não tome isso como uma comparação, caso você também tenha). Os dentes grandes aumentam a área de mastigação e trituram melhor as folhas e retiram todos os nutrientes. O intestino longo tem a função de absorver ao máximo as substâncias.

No passado, nós também nos alimentávamos como os chimpanzés. Mas há 2,5 milhões de anos houve uma mudança na nossa dieta. Começamos a incluir grandes mamíferos no nosso cardápio, alterando a nossa ingestão de proteína. Sem isso não teríamos desenvolvido o crescimento do cérebro. O aumento do consumo de carne permitiu que o corpo investisse mais no sistema nervoso.


De tudo que comemos hoje, 40% vira combustível para fazer o cérebro funcionar. Sem a carne, isso não teria acontecido. Tem quem afirme que o incômodo em comer carne é moral, e não temos direito de matar para comer. Não basta pararmos de comer carne que irá evitar a matança. Há inúmeros produtos vendidos que incluem animais mortos que nem imaginamos. Boa parte da indústria de vestuários necessita da utilização de animais. O couro é a pele de animais abatidos. Os filmes fotográficos são recobertos com uma gelatina retirada da canela dos bovinos assim como substâncias dos cascos que servem para fazer a espuma de extintores de incêndio.


O sangue de vários animais rende um ótimo fixador para tinturas e a gordura em pneus, plásticos, PVC, velas e detergentes. Alguns medicamentos são feitos com partes do pâncreas de gados. E se todos fossem vegetarianos? Possivelmente não haveria tanta fome no mundo, porque os rebanhos consomem grande quantidade dos recursos naturais. Uma simples vaca, em um único gole, ingere até 2 litros de água e em um dia pode consumir 100 litros e para produzir 1 quilo de carne, se gasta 43 mil litros de água. Em nível de comparação, são necessários 200 litros de água para produzir 1 quilo de tomates.


Sem falar que são os animais que mais consomem os vegetais que produzimos. As vacas consomem 1/3 dos grãos, só que no Brasil, graças ao clima, elas vivem soltas e se alimentam de grama. A maior parte da soja que é produzida aqui é exportada para alimentar outros gados no mundo. A pressão para o aumento da área terrestre para a criação de pastos tem sido tema de vários debates. Entre outros prejuízos causados pelos gados, está o aquecimento global causado pelos gases liberados por bois e ovelhas que vem aumentando o efeito estufa.


Como já citado, os bois aqui no Brasil são criados livres, diferente de países frios que os confinam em locais fechados e se alimentando somente de rações. Nesses locais, se produzem vitela, uma carne muito branca e macia de bezerros mantidos em jaulas apertadas que evita a movimentação. Para aumentar a coloração branca eles evitam que comam grama ou grãos, Só leite, pois a dieta tem que ser pobre de ferro. Para evitar infecções e desnutrição, eles recebem antibióticos.


Há vários relatos de matadouros que fazem os animais sangrarem ainda conscientes. O abate à marretadas está proibido no país, o que não impede que aconteça, já que 50% dos abates são clandestinos e não passam por fiscalização. As galinhas vivem uma vida sofrida. Em gaiolas espremidas, com luzes 18 horas para impedir que durmam e assim comam muito e produzam mais ovos. Tem seus bicos cortados para que não matem uma às outras e para evitar que selecionem quais as rações irão comer. A morte é rápida. As galinhas são colocadas em uma esteira rolante com um eletrodo. São desacordadas pelo choque e uma lâmina corta seu pescoço. Nos Estados Unidos, os pintinhos machos são sacrificados em um liquidificador gigante. É uma das mortes mais indolores entre várias, acredite.


Pobres porcos, não têm nem um espaço adequado para deitar confortavelmente e vivem confiados do nascimento ao abate. As leitoas são amarradas a uma fivela e forçadas a parir. Após o abate, são jogados em uma água fervendo para facilitar a retirada da pele. As vezes alguns são jogados vivos na água, por "falha humana".


Na França, o foi gras, um patê hiper tradicional, é feito com fígado inflamado dos patos e gansos. É colocado um funil na boca pelos criadores para que comam sem vontade e assim o fígado tenha que trabalhar mais e fique inflamado. Como resultado: aumenta seu tamanho e recheado de gordura. Já existem movimentos contra esse tipo de produção.


Ao comermos carne, uma verdade inescusável existe: somos, indiretamente, responsáveis pela morte de vários animais que têm família, sofrem, sentem dor e medo. Mas ao menos podemos diminuir o sofrimento ao escolhermos comidas que utilizem meios menos cruéis. Temos alternativas no mercado. Ovos caipiras de galinhas criadas soltas, certificados de bois com "garantia de origem" oferecem carne de animais tratados por especialistas em comportamento animal que compreendem o manejo e não utilizam a violência como recurso de abate. Poucos estão buscando esses alimentos por desconhecerem sua produção.


A escolha agora e sua, alface ou bisteca?

Esta apresentação reflete a opinião pessoal do autor sobre o tema, podendo não refletir a posição oficial do Portal Educação.


Philip Ferreira

por Philip Ferreira

Biólogo e pedagogo

Portal Educação

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